quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Ostra feliz não faz pérola!!! (Diário da Mirys)


Rubem Alves

Ostras são moluscos, animais sem esqueleto, macias, que são as delícias dos gastrônomos. Podem ser comidas cruas, com pingos de limão, com arroz, paellas, sopas. Sem defesas – são animais mansos – seriam uma presa fácil dos predadores.

Para que isso não acontecesse a sua sabedoria as ensinou a fazer casas, conchas duras, dentro das quais vivem. Pois havia num fundo de mar uma colônia de ostras, muitas ostras. Eram ostras felizes. Sabia-se que eram ostra felizes porque de dentro de suas conchas saía uma delicada melodia, música aquática, como se fosse um canto gregoriano, todas cantando a mesma música. Com uma exceção: de uma ostra solitária que fazia um solo solitário. Diferente da alegre música aquática, ela cantava um canto muito triste. As ostra felizes se riam dela e diziam: “Ela não sai da sua depressão...” Não era depressão. Era dor. Pois um grão de areia havia entrado dentro da sua carne e doía, doía, doía. E ela não tinha jeito de se livrar dele, do grão de areia. Mas era possível livrar-se da dor. O seu corpo sabia que, para se livrar da dor que o grão de areia lhe provocava, em virtude de suas aspereza, arestas e pontas, bastava envolvê-lo com uma substância lisa, brilhante e redonda. Assim, enquanto cantava seu canto triste, o seu corpo fazia o seu trabalho – por causa da dor que o grão de areia lhe causava.

Um dia passou por ali um pescador com o seu barco. Lançou a sua rede e toda a colônia de ostras, inclusive a sofredora, foi pescada. O pescador se alegrou, levou-as para a sua casa e sua mulher fez uma deliciosa sopa de ostras. Deliciando-se com as ostras de repente seus dentes bateram numa objeto duro que estava dentro da ostra. Ele tomou-o em suas mãos e deu uma gargalhada de felicidade: era uma pérola, uma linda pérola. Apenas a ostra sofredora fizera uma pérola. Ele tomou a pérola e deu-a de presente para a sua esposa. Ela ficou muito feliz...”

Ostra feliz não faz pérolas. Isso vale para as ostras e vale para nós, seres humanos. As pessoas que se imaginam felizes simplesmente se dedicam a gozar a vida. E fazem bem. Mas as pessoas que sofrem, elas têm de produzir pérolas para poder viver. Assim é a vida dos artistas, dos educadores, dos profetas. Sofrimento que faz pérola não precisa ser sofrimento físico. Raramente é sofrimento físico. Na maioria das vezes são dores na alma.

5 comentários:

Unknown disse...

Amiga, que texto LINDO!
Obrigada por compartilhar...
Bjs
Amo vcs!

Anônimo disse...

Vide por Ludwig van Beethoven, Wolfgang Amadeus Mozart, Albert Einstein, e tantos outros que sofriam de alguma "dor emocional". Eles produziram pérolas!
Mirys, sua forma de conduzir a vida (na alegria e na tristeza) e sua maneira de escrever, produzem para nós, seus leitores, verdadeiras pérolas!
Continue transformando sua dor em pérola, o Fer teria muito orgulho disso.
Um beijo.
Cinthya

Unknown disse...

Olá, Mirys!

Me chamo Natalia e faço parte da equipe de divulgação online do filme Eu e Meu Guarda Chuva, que estreia agora dia 8. Gostei do seu blog e gostaria de conversar com você sobre divulgação online.

Se estiver interessada, por favor, entre em contato comigo pelo email oficial.euemeuguardachuva@gmail.com

Beijos,

Natalia

Leleca disse...

Texto lindo mesmo! De fazer a gente pensar quando maldiz uma dor...
Beijão, fique com Deus.

Anônimo disse...

Pronto! Estou participando do sorteio, Nina. :-)