Naquela manhã, depois do “recomeço” no Brasil, eu tinha um sorriso no rosto, de uma criança que ganha o doce que ela estava esperando por muito tempo... Eu não esperava que me ligassem, aparecessem na minha porta com botões de rosa, saíssem fazendo declarações de amor pra mim. Mas eu tinha dado um grande passo, na descoberta de mim mesma. Eu tinha provado pra mim mesma que era possível e que, um dia, quando eu estivesse pronta, alguém que realmente me quisesse poderia aparecer...
Só que eu estava errada e, horas depois, ele me ligou. Falei tantos “nãos” praquele moço, logo de cara, que eu não sei nem se EU MESMA teria insistido em mim. Mas ele insistiu. E nos vimos, de novo.
Eu pensei com os meus botões: “vou fazer como a minha amiga C. Vou falar tudo, logo de cara. A pessoa só fica se quiser muito! E claro que ele não vai querer muito, tendo ficado comigo só uma vez. Ele vai se assustar com esse bla-bla-bla de sou viúva, tenho filhos, etc e tal. É isso. Vou fazer assim.” Sem perceber, eu continuava a me boicotar. Eu estava uma confusão completa e quem quer que aparecesse, nessa fase, ia acabar suportando situações nada comuns em relacionamentos normais...
Mas, nós nos encontramos e conversamos sobre coisas banais e agradáveis. Quando eu contei a história da viuvez, ele só perguntou se eu queria falar sobre o assunto. Eu respondi que não. Ele perguntou se eu estava bem. Eu respondi que sim. Ficamos instantaneamente amigos. E combinamos de nos encontramos de novo, de um jeito meio ligth, do tipo “a gente vai se falando”. Nada com dia e hora marcado. Aquela coisa meio ao acaso...
Eu: “Mas, eu não quero namorar. Não quero relacionamento. Não quero nada público. Eu não estou preparada.”
Ele: “Tudo bem, Mirys. Eu também não quero. Só quero continuar conhecendo você.”
Eu: “Então, a gente faz assim: se vê quando der e quiser.”
E pensei alto: “Isso vai ser uma deliciosa pausa na minha realidade...”
Ele sorriu.
Então, ficamos assim: ele seria a minha pausa e eu seria a dele.
Cenas do próximo capítulo aqui
segunda-feira, 30 de julho de 2012
Interlúdio 19 - a pausa (Diário da Mirys)
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domingo, 29 de julho de 2012
Interlúdio 18 - indecisão (Diário da Mirys)
Voltei da viagem com as energias recarregadas, cheia de pensamento positivo na cabeça, realmente disposta a me dar uma segunda chance. E uma terceira. E uma quarta. Quem sabe? Eu, que sempre fui de “relacionamentos”, de repente, estava com o maior medo de me envolver. Eu queria, sim, sair com alguém, encontrar alguém + conversar + beijar, mas me relacionar, assim, no sentido verdadeiro da palavra, eu dizia que eu não queria, não! Eu estava bem consciente e não ia esperar que alguém me ligasse no dia seguinte. Eu já me preparei pra não me frustrar.
Talvez eu tivesse o medo estúpido de que a próxima pessoa morresse, também. Ridículo, eu sei. Irracional, também. Mas eu pensei tantas e tantas coisas sem sentido pra maioria da população normal, enquanto atravessava essa fase de viuvez, que um pensamento maluco a mais, um a menos, não faria muita diferença. Talvez eu não estivesse preparada para envolver as crianças, a minha família, a família do Fer, com uma nova história. Talvez (certeza!) eu ainda me sentisse casada e pessoas casadas não namoram! Nem deveriam encontrar + conversar + beijar outras pessoas, também!!! Mas eu me sentiria “menos infiel” se não namorasse....
Por isso voltei disposta a mudar de ares, sair todo final de semana, ser observada, observar. Pessoas diferentes. Uma vida mais descompromissada. Mas, eu tinha minha listinha de exigências (que eu tinha passado até pra Deus, nas minhas orações, lembram?) e algumas das mais importantes eram:
• Que a nova pessoa não me conhecesse de antes, não conhecesse o Fer, não soubesse da minha história de vida. Já imaginaram como seria ir num barzinho, ouvir uma música, (eu) lembrar do Fer, pensar (“poxa... o Fer gostava/não gostava dessa música”) e ouvir a pessoa com quem eu saia falar “poxa... o Fer gostava/não gostava dessa música...”??? Não ia dar! Mesmo que a pessoa não falasse, eu tinha a impressão de que sempre iria achar que ela estava PENSANDO exatamente naquilo e não me falava por dó / ciúmes. Enfim, não me conhecer era pré-requisito;
• Que a nova pessoa não tivesse uma história de vida, também. Claro que, com 36 anos, eu não ia encontrar alguém que nuuuunca tivesse beijado, antes. Claro que não! Mas, eu podia achar alguém que não tivesse ex, filhos, fosse viúvo, nem nada forte e marcante assim. De “histórias tristes e pesadas” bastava a minha!
Naquela época, eu não podia ver o quão errada eu estava. E essas eram as minhas exigências! Por isso, quando voltei da viagem e, uma semana depois, tinha 5 pessoas querendo se encontrar comigo, eu me senti... frustrada! Porque todas, t-o-d-a-s elas eram pessoas amigas de ANTES. Todas conheciam o Fernando, tinham acompanhado minha história. Todas tinham suas próprias histórias de vida: fortes e marcantes e complicadas. E eu descartei qualquer possibilidade, logo de cara!
Eu achava que, agora, com a minha mudança de atitude, eu encontraria zilhões de caras por aí. Mas... eu sou muito boa na teoria e péssima na prática! Eu não saia nos finais de semanas (tenho várias desculpas, tá?), eu continuava vivendo em torno das crianças e das famílias, eu era a própria definição do Chico Buarque “todo dia ela faz tudo sempre igual”. Como, COMO eu esperava que uma pessoa nova fosse aparecer se eu só circulava onde já me conheciam??? Sou uma lástima...
E num sábado, fui trabalhar, com fotos, para uma família que eu amo. Festa ótima, gente amiga, "trabalho" que eu amo. E eu ainda podia comer, dançar e comemorar, entre uma foto e outra, pois eu também era convidada da festa. Mas, às 6hs da manhã, chegou a hora de ir embora.
Foi quando a única pessoa que eu não conhecia na festa (e, consequentemente, não me conhecia) veio falar comigo. Que eu era muito bacana. Que eu era simpática (ôh sina!). Que ele estava impressionado de conhecer uma menina que gostasse (e conhecesse) Beatles e Legião. Que ele tinha me olhado a noite inteira. E pediu pra me beijar... e eu disse um sonoro “NÃO”.
Nos milésimos de segundos seguintes, eu vi um filminho da minha vida passar por mim: me vi namorando o Fer, me vi casando, me vi fazendo planos de “pra sempre”, me vi sentada na beira da estrada no dia do acidente, me vi viúva e chorosa, me vi orando pedindo pra não ficar mais sozinha, me vi recebendo CINCO contatos de meninos diferentes, me vi falando pra Deus “ah, esses eu não quero porque eles já me conhecem...quero alguém diferente”, e me vi falando “não” pra pessoa “diferente” que estava bem ali, na minha frente. Eu me senti completamente ridícula, mas posso afirmar, com uns 98% de certeza, de que eu me virei pra ele e disse: “olha, volta... que eu mudei de ideia”. Talvez tenha dito... talvez não...
Mas ele voltou e ficou comigo, até umas 8hs da manhã. E eu voltei pra casa leve. Eu tinha beijado alguém. No Brasil. Em Jaú! Alguém tão dentro dos meus padrões (ou seja, fisicamente parecido com o Fernando), mas que desconhecia totalmente esse fato. Ou o Fer. Ou a minha história. Alguém pra quem eu era só uma garota que ele tinha acabado de conhecer e que podia ser que ele nunca mais visse...
Cenas do próximo capítulo aqui
Talvez eu tivesse o medo estúpido de que a próxima pessoa morresse, também. Ridículo, eu sei. Irracional, também. Mas eu pensei tantas e tantas coisas sem sentido pra maioria da população normal, enquanto atravessava essa fase de viuvez, que um pensamento maluco a mais, um a menos, não faria muita diferença. Talvez eu não estivesse preparada para envolver as crianças, a minha família, a família do Fer, com uma nova história. Talvez (certeza!) eu ainda me sentisse casada e pessoas casadas não namoram! Nem deveriam encontrar + conversar + beijar outras pessoas, também!!! Mas eu me sentiria “menos infiel” se não namorasse....
Por isso voltei disposta a mudar de ares, sair todo final de semana, ser observada, observar. Pessoas diferentes. Uma vida mais descompromissada. Mas, eu tinha minha listinha de exigências (que eu tinha passado até pra Deus, nas minhas orações, lembram?) e algumas das mais importantes eram:
• Que a nova pessoa não me conhecesse de antes, não conhecesse o Fer, não soubesse da minha história de vida. Já imaginaram como seria ir num barzinho, ouvir uma música, (eu) lembrar do Fer, pensar (“poxa... o Fer gostava/não gostava dessa música”) e ouvir a pessoa com quem eu saia falar “poxa... o Fer gostava/não gostava dessa música...”??? Não ia dar! Mesmo que a pessoa não falasse, eu tinha a impressão de que sempre iria achar que ela estava PENSANDO exatamente naquilo e não me falava por dó / ciúmes. Enfim, não me conhecer era pré-requisito;
• Que a nova pessoa não tivesse uma história de vida, também. Claro que, com 36 anos, eu não ia encontrar alguém que nuuuunca tivesse beijado, antes. Claro que não! Mas, eu podia achar alguém que não tivesse ex, filhos, fosse viúvo, nem nada forte e marcante assim. De “histórias tristes e pesadas” bastava a minha!
Naquela época, eu não podia ver o quão errada eu estava. E essas eram as minhas exigências! Por isso, quando voltei da viagem e, uma semana depois, tinha 5 pessoas querendo se encontrar comigo, eu me senti... frustrada! Porque todas, t-o-d-a-s elas eram pessoas amigas de ANTES. Todas conheciam o Fernando, tinham acompanhado minha história. Todas tinham suas próprias histórias de vida: fortes e marcantes e complicadas. E eu descartei qualquer possibilidade, logo de cara!
Eu achava que, agora, com a minha mudança de atitude, eu encontraria zilhões de caras por aí. Mas... eu sou muito boa na teoria e péssima na prática! Eu não saia nos finais de semanas (tenho várias desculpas, tá?), eu continuava vivendo em torno das crianças e das famílias, eu era a própria definição do Chico Buarque “todo dia ela faz tudo sempre igual”. Como, COMO eu esperava que uma pessoa nova fosse aparecer se eu só circulava onde já me conheciam??? Sou uma lástima...
E num sábado, fui trabalhar, com fotos, para uma família que eu amo. Festa ótima, gente amiga, "trabalho" que eu amo. E eu ainda podia comer, dançar e comemorar, entre uma foto e outra, pois eu também era convidada da festa. Mas, às 6hs da manhã, chegou a hora de ir embora.
Foi quando a única pessoa que eu não conhecia na festa (e, consequentemente, não me conhecia) veio falar comigo. Que eu era muito bacana. Que eu era simpática (ôh sina!). Que ele estava impressionado de conhecer uma menina que gostasse (e conhecesse) Beatles e Legião. Que ele tinha me olhado a noite inteira. E pediu pra me beijar... e eu disse um sonoro “NÃO”.
Nos milésimos de segundos seguintes, eu vi um filminho da minha vida passar por mim: me vi namorando o Fer, me vi casando, me vi fazendo planos de “pra sempre”, me vi sentada na beira da estrada no dia do acidente, me vi viúva e chorosa, me vi orando pedindo pra não ficar mais sozinha, me vi recebendo CINCO contatos de meninos diferentes, me vi falando pra Deus “ah, esses eu não quero porque eles já me conhecem...quero alguém diferente”, e me vi falando “não” pra pessoa “diferente” que estava bem ali, na minha frente. Eu me senti completamente ridícula, mas posso afirmar, com uns 98% de certeza, de que eu me virei pra ele e disse: “olha, volta... que eu mudei de ideia”. Talvez tenha dito... talvez não...
Mas ele voltou e ficou comigo, até umas 8hs da manhã. E eu voltei pra casa leve. Eu tinha beijado alguém. No Brasil. Em Jaú! Alguém tão dentro dos meus padrões (ou seja, fisicamente parecido com o Fernando), mas que desconhecia totalmente esse fato. Ou o Fer. Ou a minha história. Alguém pra quem eu era só uma garota que ele tinha acabado de conhecer e que podia ser que ele nunca mais visse...
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Interlúdio 17 - crie novas lembranças (Diário da Mirys)
Antes de voltar da Alemanha pro Brasil, eu preciso dar uma paradinha rápida na Espanha, pra explicar uma coisa importante, que me ajudou a mudar de pensamento. Vocês me acompanham?
Um mês antes de casar com o Fernando, eu morava/trabalhava/estudava na França e ele tinha ido me buscar. Na viagem de volta, nós passamos em Barcelona e adoramos o lugar. Viemos pro Brasil, nos casamos, as crianças nasceram, ele morreu. O sonho de voltar pra Paris e Barcelona, adiado por 12 anos, não ia mais se realizar. Pelo menos, não COM o Fer.
Quando fez um ano do acidente, eu tirei férias e levei as crianças pra viajar, pra longe do tumulto, das celebrações fúnebres. E nós acabamos indo pra Barcelona, visitar minha irmã que, agora, morava por lá. Enquanto estive por lá, eu passei e conversei muito com meu cunhado D.
Menos de um ano depois, por causa do casamento da minha prima com um alemão, lá estava eu, de novo, na Europa! Pra quem esperou por 12 anos, poder voltar pra lá, duas vezes, em 9 meses, era o máximo!!! E era aniversário do meu cunhado. Então, eu fiz questão absoluta de terminar a viagem em Barcelona, pra poder comemorar com os dois. Seriam só dois dias, mas dois dias em Barcelona são DOIS DIAS EM BARCELONA! E eu fui.
Cheguei na manhã da sexta e fui embora na tarde do sábado. Com uma comemoração de aniversário no meio do caminho, é claro que não ia dar tempo de fazer nenhum programa turístico... E tudo o que deu pra fazer foi passear, de vespa, com o meu cunhado, por uma horinha. E nós passamos pelo zoo, que o Guigo tinha amado; e vimos a padaria que a Nina tinha gostado; e fomos em frente do monumento onde as crianças tinham tirado foto; e relembramos aqueles dias bons da viagem anterior. E meu cunhado (amo, amo, amo!!!) observou algo tão óbvio que eu não sei como não tinha percebido antes:
D – “Mirys, você reparou que, na outra vez, você só dizia ‘estive aqui com o Fer’, ‘o Fer gostou disso’, ‘o Fer não gostou daquilo’....e, agora, você fala ‘o Guigo gostou disso’, ‘a Nina gostou daquilo’?”
Eu – “É...é que, antes, eu só tinha a viagem com o Fer, pra lembrar. Agora, eu tenho outra.”
D – “Mirys, então, eu acho que é disso que você precisa, na vida, de uma maneira geral: novas lembranças!”
E a partir daquela conversa eu decidi que se alguma coisa me incomodava ou se eu lembrava demais do Fernando com ela... eu ia viver novas experiências e criar novas lembranças pra mim mesma! Porque a vida precisa de 2as chances. Simples e brilhante, não?
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Um mês antes de casar com o Fernando, eu morava/trabalhava/estudava na França e ele tinha ido me buscar. Na viagem de volta, nós passamos em Barcelona e adoramos o lugar. Viemos pro Brasil, nos casamos, as crianças nasceram, ele morreu. O sonho de voltar pra Paris e Barcelona, adiado por 12 anos, não ia mais se realizar. Pelo menos, não COM o Fer.
Quando fez um ano do acidente, eu tirei férias e levei as crianças pra viajar, pra longe do tumulto, das celebrações fúnebres. E nós acabamos indo pra Barcelona, visitar minha irmã que, agora, morava por lá. Enquanto estive por lá, eu passei e conversei muito com meu cunhado D.
Menos de um ano depois, por causa do casamento da minha prima com um alemão, lá estava eu, de novo, na Europa! Pra quem esperou por 12 anos, poder voltar pra lá, duas vezes, em 9 meses, era o máximo!!! E era aniversário do meu cunhado. Então, eu fiz questão absoluta de terminar a viagem em Barcelona, pra poder comemorar com os dois. Seriam só dois dias, mas dois dias em Barcelona são DOIS DIAS EM BARCELONA! E eu fui.
Cheguei na manhã da sexta e fui embora na tarde do sábado. Com uma comemoração de aniversário no meio do caminho, é claro que não ia dar tempo de fazer nenhum programa turístico... E tudo o que deu pra fazer foi passear, de vespa, com o meu cunhado, por uma horinha. E nós passamos pelo zoo, que o Guigo tinha amado; e vimos a padaria que a Nina tinha gostado; e fomos em frente do monumento onde as crianças tinham tirado foto; e relembramos aqueles dias bons da viagem anterior. E meu cunhado (amo, amo, amo!!!) observou algo tão óbvio que eu não sei como não tinha percebido antes:
D – “Mirys, você reparou que, na outra vez, você só dizia ‘estive aqui com o Fer’, ‘o Fer gostou disso’, ‘o Fer não gostou daquilo’....e, agora, você fala ‘o Guigo gostou disso’, ‘a Nina gostou daquilo’?”
Eu – “É...é que, antes, eu só tinha a viagem com o Fer, pra lembrar. Agora, eu tenho outra.”
D – “Mirys, então, eu acho que é disso que você precisa, na vida, de uma maneira geral: novas lembranças!”
E a partir daquela conversa eu decidi que se alguma coisa me incomodava ou se eu lembrava demais do Fernando com ela... eu ia viver novas experiências e criar novas lembranças pra mim mesma! Porque a vida precisa de 2as chances. Simples e brilhante, não?
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sábado, 28 de julho de 2012
Interlúdio 16 - a sua atitude muda a reação das pessoas (Diário da Mirys)
Depois de ver partir aquela pessoa com quem eu prometi passar o resto dos meus dias, depois de ficar sozinha por quase dois anos, depois de já ter chorado e orado tudo o que eu podia, eu enfim conseguia ver aquilo que o resto do mundo falava pra mim: eu era muito nova pra que minha vida acabasse ali, naquele acidente, junto com o Fer. Eu ainda teria mais coisas, viajaria pra outros lugares, veria novas paisagens, gostaria de outras pessoas. Enfim, eu continuaria a viver. Apesar de.
E eu comecei a fazer li-te-ral-men-te as três primeiras coisas da lista acima: entrei num trem, sozinha, de noite, em Hagen (Alemanha) e acordei em Praga (República Tcheca). Me apaixonei por Viena. Vi o castelo da Cinderela. E Barcelona (e a minha irmã) me aguardava, pra fechar com chave de ouro aquela viagem de 2 semanas que mudaria a minha vida.
Eu, que nunca tinha “ficado” com alguém, na minha vida, tinha ido pro outro lado do mundo e beijado um alemão! Ora, ora, vejam só!... Eu pensava nisso e gargalhava, sozinha, dentro de todos os trens que eu tomei!!!!
Aquele moço não era perfeito no momento só porque ele era totalmente diferente do Fernando. Não, ele tinha um plus: ele morava em outro continente e eu nunca mais iria vê-lo! Então, eu tinha o direito de errar. Errar feio, se preciso fosse. Eu podia beijar errado, falar bobagem, não ser a melhor companhia do mundo que TUDO BEM. Eu não ia vê-lo mais... Mas acho que não fiz nada disso. Porque, na manhã seguinte, já recebi um torpedo dele. E mais outro. E mais outro. E fui passeando, na Europa, trocando torpedos com um alemão. Enquanto eu andava sob a chuva de Praga, ele visitava amigos em Hagen. Enquanto eu me encantava com Viena, ele palestrava em uma faculdade. Enquanto eu chorava, na frente do castelo da Cinderela, no sul da Alemanha, ele trabalhava pra terminar um projeto. E, dentre muitos torpedos, ele me mandou um assim: “adoraria tomar um café com você em Stgd”.
Ele morava em Stgd, uma cidade grande, no sul da Alemanha também, mas umas três horas de trem de onde eu estava. E eu fui pra estação comprar a passagem pro próximo destino. Eu podia conhecer o leste da Suiça, antes de partir pra Barcelona.... ou ir pra Stgd, e partir pra Barcelona de lá. E como eu acho que passar pela vida sem emoções (saudáveis e que não trazem prejuízo pra ninguém) é uma COMPLETA BOBAGEM, eu comprei a passagem pra Stgd! Eu não ia avisá-lo, é óbvio! Não queria que ele se sentisse na obrigação de me acompanhar, na “cidade dele”. Eu ia visitar a cidade! Mas, se desse certo....
Meu último torpedo com ele tinha sido na noite anterior. Eu tinha parado numa cidadezinha, no meio do caminho, e já estava no trem, pra segunda metade da viagem, quando ele me mandou uma mensagem: “estamos na loucura pra entregar esse projeto. Desculpa não te ligar antes. Como está? Onde está?”. ONDE está! Ele tinha perguntado ONDE eu estava. Bom sinal, aquele.... Respondi que estava no trem, saindo da tal cidadezinha. “E aí, senhorita insone, qual a próxima parada?”. Eu falei sobre o insone e não falei sobre a parada. Eu NÃO queria que ele fizesse nada por obrigação e eu ACHAVA que ele ia se sentir assim, se eu falasse de Stgd. “Mas, me conta, qual o próximo museu que você vai ver?”. E eu falei o nome de um dos museus da cidade dele. “Você está vindo pra Stgd?????” Eu comecei a escrever que sim, mas que ele não precisava se preocupar e bla-bla-bla, quando chegou outro torpedo (só eu sei o quanto eu gastei de torpedos Brasil/Europa, naquela viagem) “A que horas você chega? Em qual plataforma? Eu VOU te buscar.” Simples assim.... jogando todas as minhas neuras ao vento e ainda abanando, que era pra não deixar dúvida....
Quando eu o encontrei, na estação, ele usava blazer e jeans... e tênis verdes! Juro! Comecei a reparar no pé de todo mundo por lá e isso era bem normal – usar tênis e voltar pra casa andando, depois do trabalho. Então, tanto fazia a cor, porque não era pra combinar, mesmo... Deixamos minha mala num depósito e ele me disse “vem, quero te mostrar umas coisas”. E lá fui eu, conhecer o centro histórico de uma cidade que tinha vivido as guerras mundiais, a reforma da igreja, etc e tal, acompanhada de um arquiteto!!! Um arquiteto legítimo e local!!! Pra quem é apaixonada por história, como eu, conhecer todos aqueles prédios e praças, com alguém que entende porque tal telhado é assim, porque tal fachada é assado, como era antes e como ficou depois, foi um deleite! Gastamos horas e horas andando, conversando, trocando ideias sobre costumes, países, gostos. Quando falávamos sobre temperatura (eu adoro o frio, mas m-o-r-r-o de frio, no menor ventinho – e estava um ventão), passou por nós uma menina linda, com uma saia minúscula. “Viu? Eu não sei como vocês conseguem! Eu jamais poderia usar uma saia daquela com um frio desses...” “Que saia?” “Daquela menina, que passou por nós, agora.” “Que menina?”. Dá pra não se sentir linda e única, do lado de um cara com uma atitude dessas?
“Está com fome?” E ele me levou pra um restaurante ótimo, num bairro alto da cidade. Escolheu uma mesa perto da parede, me sentou e se sentou na minha frente. No meu campo de visão, toooodo o restaurante africano e todas as pessoas que estavam lá. No campo de visão dele, só eu. E tomamos vinho, e jantamos, e conversamos mais. Em nenhum momento a gente tinha falado da gente ou ele tinha tentado alguma coisa, mas ele já tinha deixado bem claro que estava comigo. Naquele momento, eu não estava mais sozinha...
Quando pegamos a mala no depósito, caminhamos, pelo meio de um parque. “Não é perigoso? Já é mais de meia-noite!...” Pra minha sorte, na Alemanha, não era perigoso. E, no meio do caminho, ele parou na minha frente, segurou no meu rosto e disse: “é uma pena que você more do outro lado do mundo...”. E me beijou.
Naqueles dias, eu entendi que, se uma parte minha tinha morrido junto com o Fer, ainda tinha uma outra parte que tinha ficado. Que eu ainda estava viva... que eu ainda era notada... que eu ainda poderia ser desejada (no melhor sentido da palavra) por outro alguém... Que aquela estória de só existir uma tampa pra cada panela não é 100% verdade. Algumas tampas não vão te servir de jeito nenhum. São grandes demais, pequenas demais, priorizam outras coisas. Mas, não é possível que, num mundo tão imenso desses, só existisse uma pessoa pra mim, que ela morasse exatamente na mesma cidade que eu e que, se ela morresse (ou me deixasse por qualquer outro motivo), eu estaria fadada a ficar sozinha para sempre e sempre...
Depois de uma semana que eu estava no Brasil, eu recebi QUATRO propostas para sair / jantar de novas pessoas + UMA proposta de um ex-namorado. Tudo o que não tinha acontecido em quase dois anos, acontecia, agora, tudo junto, em uma semana! E eu parei pra prestar atenção que eu estava me arrumando mais, depois da Alemanha; me cuidando mais; saindo mais; sorrindo (sinceramente) mais. E que o que eu sentia por dentro fazia toda a diferença no que as pessoas viam por fora! Ou eu comecei a olhar mais para o lado... sei lá! Só sei que a MINHA ATITUDE de decidir recomeçar, até brigando comigo mesma se preciso fosse, fez toda a diferença....
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E eu comecei a fazer li-te-ral-men-te as três primeiras coisas da lista acima: entrei num trem, sozinha, de noite, em Hagen (Alemanha) e acordei em Praga (República Tcheca). Me apaixonei por Viena. Vi o castelo da Cinderela. E Barcelona (e a minha irmã) me aguardava, pra fechar com chave de ouro aquela viagem de 2 semanas que mudaria a minha vida.
Eu, que nunca tinha “ficado” com alguém, na minha vida, tinha ido pro outro lado do mundo e beijado um alemão! Ora, ora, vejam só!... Eu pensava nisso e gargalhava, sozinha, dentro de todos os trens que eu tomei!!!!
Aquele moço não era perfeito no momento só porque ele era totalmente diferente do Fernando. Não, ele tinha um plus: ele morava em outro continente e eu nunca mais iria vê-lo! Então, eu tinha o direito de errar. Errar feio, se preciso fosse. Eu podia beijar errado, falar bobagem, não ser a melhor companhia do mundo que TUDO BEM. Eu não ia vê-lo mais... Mas acho que não fiz nada disso. Porque, na manhã seguinte, já recebi um torpedo dele. E mais outro. E mais outro. E fui passeando, na Europa, trocando torpedos com um alemão. Enquanto eu andava sob a chuva de Praga, ele visitava amigos em Hagen. Enquanto eu me encantava com Viena, ele palestrava em uma faculdade. Enquanto eu chorava, na frente do castelo da Cinderela, no sul da Alemanha, ele trabalhava pra terminar um projeto. E, dentre muitos torpedos, ele me mandou um assim: “adoraria tomar um café com você em Stgd”.
Ele morava em Stgd, uma cidade grande, no sul da Alemanha também, mas umas três horas de trem de onde eu estava. E eu fui pra estação comprar a passagem pro próximo destino. Eu podia conhecer o leste da Suiça, antes de partir pra Barcelona.... ou ir pra Stgd, e partir pra Barcelona de lá. E como eu acho que passar pela vida sem emoções (saudáveis e que não trazem prejuízo pra ninguém) é uma COMPLETA BOBAGEM, eu comprei a passagem pra Stgd! Eu não ia avisá-lo, é óbvio! Não queria que ele se sentisse na obrigação de me acompanhar, na “cidade dele”. Eu ia visitar a cidade! Mas, se desse certo....
Meu último torpedo com ele tinha sido na noite anterior. Eu tinha parado numa cidadezinha, no meio do caminho, e já estava no trem, pra segunda metade da viagem, quando ele me mandou uma mensagem: “estamos na loucura pra entregar esse projeto. Desculpa não te ligar antes. Como está? Onde está?”. ONDE está! Ele tinha perguntado ONDE eu estava. Bom sinal, aquele.... Respondi que estava no trem, saindo da tal cidadezinha. “E aí, senhorita insone, qual a próxima parada?”. Eu falei sobre o insone e não falei sobre a parada. Eu NÃO queria que ele fizesse nada por obrigação e eu ACHAVA que ele ia se sentir assim, se eu falasse de Stgd. “Mas, me conta, qual o próximo museu que você vai ver?”. E eu falei o nome de um dos museus da cidade dele. “Você está vindo pra Stgd?????” Eu comecei a escrever que sim, mas que ele não precisava se preocupar e bla-bla-bla, quando chegou outro torpedo (só eu sei o quanto eu gastei de torpedos Brasil/Europa, naquela viagem) “A que horas você chega? Em qual plataforma? Eu VOU te buscar.” Simples assim.... jogando todas as minhas neuras ao vento e ainda abanando, que era pra não deixar dúvida....
Quando eu o encontrei, na estação, ele usava blazer e jeans... e tênis verdes! Juro! Comecei a reparar no pé de todo mundo por lá e isso era bem normal – usar tênis e voltar pra casa andando, depois do trabalho. Então, tanto fazia a cor, porque não era pra combinar, mesmo... Deixamos minha mala num depósito e ele me disse “vem, quero te mostrar umas coisas”. E lá fui eu, conhecer o centro histórico de uma cidade que tinha vivido as guerras mundiais, a reforma da igreja, etc e tal, acompanhada de um arquiteto!!! Um arquiteto legítimo e local!!! Pra quem é apaixonada por história, como eu, conhecer todos aqueles prédios e praças, com alguém que entende porque tal telhado é assim, porque tal fachada é assado, como era antes e como ficou depois, foi um deleite! Gastamos horas e horas andando, conversando, trocando ideias sobre costumes, países, gostos. Quando falávamos sobre temperatura (eu adoro o frio, mas m-o-r-r-o de frio, no menor ventinho – e estava um ventão), passou por nós uma menina linda, com uma saia minúscula. “Viu? Eu não sei como vocês conseguem! Eu jamais poderia usar uma saia daquela com um frio desses...” “Que saia?” “Daquela menina, que passou por nós, agora.” “Que menina?”. Dá pra não se sentir linda e única, do lado de um cara com uma atitude dessas?
“Está com fome?” E ele me levou pra um restaurante ótimo, num bairro alto da cidade. Escolheu uma mesa perto da parede, me sentou e se sentou na minha frente. No meu campo de visão, toooodo o restaurante africano e todas as pessoas que estavam lá. No campo de visão dele, só eu. E tomamos vinho, e jantamos, e conversamos mais. Em nenhum momento a gente tinha falado da gente ou ele tinha tentado alguma coisa, mas ele já tinha deixado bem claro que estava comigo. Naquele momento, eu não estava mais sozinha...
Quando pegamos a mala no depósito, caminhamos, pelo meio de um parque. “Não é perigoso? Já é mais de meia-noite!...” Pra minha sorte, na Alemanha, não era perigoso. E, no meio do caminho, ele parou na minha frente, segurou no meu rosto e disse: “é uma pena que você more do outro lado do mundo...”. E me beijou.
Naqueles dias, eu entendi que, se uma parte minha tinha morrido junto com o Fer, ainda tinha uma outra parte que tinha ficado. Que eu ainda estava viva... que eu ainda era notada... que eu ainda poderia ser desejada (no melhor sentido da palavra) por outro alguém... Que aquela estória de só existir uma tampa pra cada panela não é 100% verdade. Algumas tampas não vão te servir de jeito nenhum. São grandes demais, pequenas demais, priorizam outras coisas. Mas, não é possível que, num mundo tão imenso desses, só existisse uma pessoa pra mim, que ela morasse exatamente na mesma cidade que eu e que, se ela morresse (ou me deixasse por qualquer outro motivo), eu estaria fadada a ficar sozinha para sempre e sempre...
Depois de uma semana que eu estava no Brasil, eu recebi QUATRO propostas para sair / jantar de novas pessoas + UMA proposta de um ex-namorado. Tudo o que não tinha acontecido em quase dois anos, acontecia, agora, tudo junto, em uma semana! E eu parei pra prestar atenção que eu estava me arrumando mais, depois da Alemanha; me cuidando mais; saindo mais; sorrindo (sinceramente) mais. E que o que eu sentia por dentro fazia toda a diferença no que as pessoas viam por fora! Ou eu comecei a olhar mais para o lado... sei lá! Só sei que a MINHA ATITUDE de decidir recomeçar, até brigando comigo mesma se preciso fosse, fez toda a diferença....
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sexta-feira, 27 de julho de 2012
Interlúdio 15 - eu, finalmente, me encontrei... comigo! (Diário da Mirys)
(Se prepara que essa é longa. Mas vale a pena!!!)
Em 30 dias, terminei meus trabalhos pendentes, arrumei malas, guardei dinheiro, renovei passaporte, organizei casa + crianças + escola + carro, e parti para o aeroporto internacional de Guarulhos!!! Da última vez que eu tinha estado lá, tinha ido chorando (muito por dentro, só um pouquinho por fora). Eu ia realizar o meu plano com o Fernando de levar as crianças para ver a cidade onde eu tinha morado (Paris)... mas eu ia realizar sozinha. Tudo o que foi dele, comigo, foi a certidão de óbito, o boletim de ocorrência e o nome dele na certidão de nascimento dos pequenos. Sem essa “companhia agradável”, eu não podia tirar meus filhos do País e leva-los pra passear. Vou te contar, viu? Ninguém merece....
Mas, agora, eu voava sozinha!!!!
Por um lado, eu estava petrificada! Eu sempre amei viajar. De avião, então!!! Tem coisa mais gostosa do que dormir num lugar e acordar em outro, cheio de expectativas pra ver paisagens diferentes, comer comidas diferentes, ouvir línguas diferentes??? Mas... viajar sozinha era um RISCO GRANDE DEMAIS e eu tinha aprendido a não correr NENHUM RISCO, nos anos de viuvez. COM as crianças, eu ia pra qualquer lugar! Se algo acontecesse, estaríamos juntos. Mas SEM as crianças... E se eu não voltasse? Eles já não tinham pai! Eu não queria correr nenhum risco de deixa-los sem mãe, também... (desculpem a neura, mas quando você fica viúva com 35 anos, você tem neuras inexplicáveis para pessoas normais...)
Por outro lado, era a primeira vez que eu ficava sozinha, totalmente, desde o acidente! 20 meses depois, longos 600 e tantos dias, eu ia ficar, finalmente, sem ninguém conhecido por perto! Podia chorar, podia rir, podia dançar no meio da rua e ninguém ia falar “que absurdo, ela chorando desse tanto depois de tanto tempo” ou “que absurdo, ela rindo desse tanto depois de tão pouco tempo”... Era a minha chance de ser SÓ a Miriane. Não a mãe do Guilherme. Não a mãe da Helena. Não a filha do médico ou da regente do coral. Não... lá eu seria só eu mesma! Eu podia me apresentar como Miriane, a advogada, mas também poderia ser Miroca - a prima da noiva, Miriane – a advogada, Mi – a brasileira (claro que ninguém ia conseguir falar Mi-ri-a-ne, assim certinho, na Alemanha) ou como Mirys – a fotógrafa! Se eu quisesse mudar até o meu nome, eu podia!!! Eu podia me apresentar como Laura, Carol, Luísa, Ana, Ernestina que NINGUÉM iria saber. Ah.... o doce gosto da liberdade....
Chegando em solo alemão, sã e salva (e livre da 1ª parte das minhas neuras de morrer no vôo – porque ainda teria a volta), eu só pensei na parte boa! Desci do avião conversando com um grego super simpático (que estava indo CASAR com uma alemã! Foca, people! Foca! Eu não ia beijar o primeiro que aparecesse no avião! Kkk) e a minha trupe já me esperava, com flores, papel com meu nome e muitos gritinhos. “Quem é esse?????”
Eu teria duas semanas na Europa: uma semana com a minha família, conhecendo a Alemanha; no sábado, o casamento; dali eu partia sozinha, para uma viagem minha comigo mesma. A primeira semana foi incrível, vi lugares bárbaros, me apaixonei por um país que nunca tinha pensado em conhecer (tem alguns flashes da viagem aqui, aqui, aqui e aqui). Falei horrooooooores em inglês (amo!), tirei inúmeras fotos (eu e meus tios brincamos de ter um curso de fotografia, “ao vivo”, durante as viagens, porque eles já acompanhavam as “dicas de fotografia” aqui do blog. Muito fofo, esse meu povo!). Mas quase não vi homens morenos na Alemanha.... e os loiros que me desculpem (gosto é gosto e não se discute), mas são os morenos que me atraem. E eu nem lembrei dessa parte minha, que continuava escondidinha láááá no fundo do baú...
E na sexta, dia do casamento civil, eu tinha um vestido lindo novo alemão (baratérrimo, da C&A de lá) pra usar, tinha tempo pra me arrumar (não tinha que vestir duas crianças), tinha um ar leve. E lá fomos nós pro cartório. A moça que ia fazer a tradução pro inglês, ficou na mesa, ao lado do cartorário, que falava em alemão. Eu fiquei do lado dos meus tios, pra traduzir pro português. Qual era o problema? Eu já tinha ido em váááários casamentos DEPOIS de ter ficado viúva. Eu aguentava, eu sabia. Então, o alemão falava, a alemã falava (em inglês) e eu falava. Lindo. Tranquilo. Sussa. Até que... chegou naquela abençoada parte do “pra sempre”, do “todos os dias da vida”, do “até que a morte os separe”. Eu engoli em seco....
Era verdade, eu já tinha ido a um monte de casamentos. Mas eu SEMPRE me entretinha com outras coisas, quando chegava nessa parte. Eu cuidava das crianças, eu ensinava o Guigo a fazer uma foto das velas acessas nos arranjos, eu arrumava o cabelo da Nina, eu saia de mim. Só que, agora, eu tinha que traduzir o casamento! Eu tinha que ouvir e entender, em inglês, e falar e entender, de novo, em português. Eu tinha que prestar atenção DUAS VEZES em cada uma daquelas frases das quais eu tanto fugia!!! E eu tinha que fazer tudo isso sorrindo, para que ninguém pensasse que eu não estava feliz pela minha prima. Porque eu estava feliz por ela. Muito feliz! Mas eu estava destroçada, por mim mesma.... E o esforço para se conciliar duas coisas tão intensas e tão diferentes era muito grande!
Acabada a cerimônia, nós fomos almoçar e eu sinto que eu só consegui voltar a respirar umas 5hs da tarde, quando tudo já se encerrava e todos começavam a se preparar para o dia seguinte (cerimônia religiosa e festa). Eu fui caminhando com os meus tios, da casa dos pais do noivo até a casa onde estávamos hospedados, peguei minha bolsa e saí: “gente, vou no correio e já volto!”. Não tinha mais correio naquela hora... todo mundo sabia disso...
Então, eu vaguei sem rumo por uma hora, talvez duas. Eu andava e andava, numa cidade minúscula de 3 mil habitantes (se tiver!), evitando uma meia dúzia de ruas, onde estavam as casas que poderiam ter pessoas que me conhecessem. Eu chorei até não poder mais! Eu senti tudo de novo, ali. Eu revi um filme. Eu chorei e orei e pedi muuuuito por aquele casamento e pelo casamento de todo mundo que eu conhecia. Que ninguém mais passasse por aquilo que eu passava! Porque era triste demais, difícil demais, intenso demais....
Quando eu voltei pra casa, minha tia (que também tinha ficado viúva, um ano antes de mim), me pegou pela mão e disse: “vamos comigo? Porque EU quero dar uma volta.” Ela era alguém que me entendia, que sofria a mesma dor, que vivia o mesmo dilema, que estava na mesma situação. E foi tão reconfortante conversar com alguém que me entendesse 100%...
Nós duas andamos por mais umas horas, até as pernas não aguentarem. E chegamos a seguinte conclusão: chega! Já tinha dado! Já tinha sido tempo suficiente pra mim! Eu tinha cuidado das crianças, do trabalho, da casa, dos meus sogros, tinha dedicado tempo aos meus irmãos, aos meus amigos, ao voluntariado...era tempo de cuidar DE MIM! E de namorar, de novo. Ela sabia que eu não sabia nem como começar, que eu não conseguia manter um olhar, que eu não conseguia responder a uma investida, que eu não tinha o menor ânimo de me arrumar e sair. Mas, me incentivou a PRATICAR! Eu decidi que aquela ia ser a minha palavra de ordem, dali pra frente: praticar!!!! Eu ia olhar, mesmo que desse vontade de chorar. Eu ia conversar, mesmo que me sentisse culpada (porque me sentia casada). Ninguém ia saber o que eu tinha por dentro se eu estivesse sorrindo por fora. Então, eu ia responder recados, aceitar convites, sair de casa. Eu IA. E ponto final!
Mas é incrível o que pouco tempo e minha personalidade fazem comigo... na manhã seguinte, eu já estava COMPLETAMENTE envolvida com o casamento religioso. Eu só me preocupava em fotografar a noiva, a família, os preparativos, em fazer o buque (verde e amarelo – lindo!!!), em organizar as lembrancinhas “brasileiras”, em traduzir conversas alheias, em ajudar todo mundo em qualquer coisa que eles me pedissem. E pensava: “amanhã, às 6hs da manhã, eu tenho um trem pra Praga! Só eu! Então, A PARTIR DE AMANHÃ, a nova Miriane começará!...” E lá fui eu, no meio de microfones, balões, fotos e cartões para os noivos, curtir o casamento.
Às 4 e pouco da manhã, quando a festa já tinha acabado, os noivos já tinham ido, só haviam no salão umas 6 ou 7 pessoas. Exatamente 7, na verdade. Dois casais alemães, duas irlandesas e um alemão. E eu. Exausta. E ainda tinha que recolher as lembrancinhas que tinham sobrado. As irlandesas foram embora. Os casais foram dormir. O alemão ficou me ajudando. E eu constatei que EU ERA UMA LÁSTIMA COMO MULHER, mesmo!!!! Precisei esperar todas as outras almas viventes ao redor irem embora para perceber que o moço alemão estava ali, olhando pra mim, conversando comigo até o fim da festa, ajudando a recolher pacotinhos vermelhos e não era só pra ser gentil (até porque os alemães não são, assim, os mais gentis da Terra)!!!!! Afe...
Eu morri de medo, eu travei, eu comecei a falar bobagens em inglês, a ter um sotaque absurdo, a rir (de nervosa). E ele lá, impassível, como todo bom alemão. Só me ajudando. Me acompanhou (carregando a caixa com as coisas) até a porta do quarto. E... nada! Então, eu bati na porta, para minha tia abrir (eu dividia o quarto com ela), e ela não veio. E o moço se aproximou. Deixou a caixa no chão. Arrumou meu cabelo. E eu só pensei: “que bom – ele é loiro, de cabelo meio comprido e liso, do meu tamanho no máximo. Ele é diferente do Fer. Ele tem a voz diferente, o cheiro diferente, tudo diferente.” Porque era pra ser assim, mesmo, diferente!!!! Pra eu não criar expectativa nenhuma pra hora de abrir os olhos....
E então... minha tia abriu a porta!
“Oi Mirys. Desculpa. Esperou muito?”
E ela abriu os olhos direito e viu o moço ali, comigo.
“AhMiryseutovoltandodormir.Entrequandoquiser” (leia tudo rápido porque ela falou assim mesmo, encostou a porta e saiu)
Ele sorriu, sem entender nada (a gente falou português).
Eu sorri, entendendo tudo. Dele, da minha tia, de mim mesma.
E eu fui beijada...
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Em 30 dias, terminei meus trabalhos pendentes, arrumei malas, guardei dinheiro, renovei passaporte, organizei casa + crianças + escola + carro, e parti para o aeroporto internacional de Guarulhos!!! Da última vez que eu tinha estado lá, tinha ido chorando (muito por dentro, só um pouquinho por fora). Eu ia realizar o meu plano com o Fernando de levar as crianças para ver a cidade onde eu tinha morado (Paris)... mas eu ia realizar sozinha. Tudo o que foi dele, comigo, foi a certidão de óbito, o boletim de ocorrência e o nome dele na certidão de nascimento dos pequenos. Sem essa “companhia agradável”, eu não podia tirar meus filhos do País e leva-los pra passear. Vou te contar, viu? Ninguém merece....
Mas, agora, eu voava sozinha!!!!
Por um lado, eu estava petrificada! Eu sempre amei viajar. De avião, então!!! Tem coisa mais gostosa do que dormir num lugar e acordar em outro, cheio de expectativas pra ver paisagens diferentes, comer comidas diferentes, ouvir línguas diferentes??? Mas... viajar sozinha era um RISCO GRANDE DEMAIS e eu tinha aprendido a não correr NENHUM RISCO, nos anos de viuvez. COM as crianças, eu ia pra qualquer lugar! Se algo acontecesse, estaríamos juntos. Mas SEM as crianças... E se eu não voltasse? Eles já não tinham pai! Eu não queria correr nenhum risco de deixa-los sem mãe, também... (desculpem a neura, mas quando você fica viúva com 35 anos, você tem neuras inexplicáveis para pessoas normais...)
Por outro lado, era a primeira vez que eu ficava sozinha, totalmente, desde o acidente! 20 meses depois, longos 600 e tantos dias, eu ia ficar, finalmente, sem ninguém conhecido por perto! Podia chorar, podia rir, podia dançar no meio da rua e ninguém ia falar “que absurdo, ela chorando desse tanto depois de tanto tempo” ou “que absurdo, ela rindo desse tanto depois de tão pouco tempo”... Era a minha chance de ser SÓ a Miriane. Não a mãe do Guilherme. Não a mãe da Helena. Não a filha do médico ou da regente do coral. Não... lá eu seria só eu mesma! Eu podia me apresentar como Miriane, a advogada, mas também poderia ser Miroca - a prima da noiva, Miriane – a advogada, Mi – a brasileira (claro que ninguém ia conseguir falar Mi-ri-a-ne, assim certinho, na Alemanha) ou como Mirys – a fotógrafa! Se eu quisesse mudar até o meu nome, eu podia!!! Eu podia me apresentar como Laura, Carol, Luísa, Ana, Ernestina que NINGUÉM iria saber. Ah.... o doce gosto da liberdade....
Chegando em solo alemão, sã e salva (e livre da 1ª parte das minhas neuras de morrer no vôo – porque ainda teria a volta), eu só pensei na parte boa! Desci do avião conversando com um grego super simpático (que estava indo CASAR com uma alemã! Foca, people! Foca! Eu não ia beijar o primeiro que aparecesse no avião! Kkk) e a minha trupe já me esperava, com flores, papel com meu nome e muitos gritinhos. “Quem é esse?????”
Eu teria duas semanas na Europa: uma semana com a minha família, conhecendo a Alemanha; no sábado, o casamento; dali eu partia sozinha, para uma viagem minha comigo mesma. A primeira semana foi incrível, vi lugares bárbaros, me apaixonei por um país que nunca tinha pensado em conhecer (tem alguns flashes da viagem aqui, aqui, aqui e aqui). Falei horrooooooores em inglês (amo!), tirei inúmeras fotos (eu e meus tios brincamos de ter um curso de fotografia, “ao vivo”, durante as viagens, porque eles já acompanhavam as “dicas de fotografia” aqui do blog. Muito fofo, esse meu povo!). Mas quase não vi homens morenos na Alemanha.... e os loiros que me desculpem (gosto é gosto e não se discute), mas são os morenos que me atraem. E eu nem lembrei dessa parte minha, que continuava escondidinha láááá no fundo do baú...
E na sexta, dia do casamento civil, eu tinha um vestido lindo novo alemão (baratérrimo, da C&A de lá) pra usar, tinha tempo pra me arrumar (não tinha que vestir duas crianças), tinha um ar leve. E lá fomos nós pro cartório. A moça que ia fazer a tradução pro inglês, ficou na mesa, ao lado do cartorário, que falava em alemão. Eu fiquei do lado dos meus tios, pra traduzir pro português. Qual era o problema? Eu já tinha ido em váááários casamentos DEPOIS de ter ficado viúva. Eu aguentava, eu sabia. Então, o alemão falava, a alemã falava (em inglês) e eu falava. Lindo. Tranquilo. Sussa. Até que... chegou naquela abençoada parte do “pra sempre”, do “todos os dias da vida”, do “até que a morte os separe”. Eu engoli em seco....
Era verdade, eu já tinha ido a um monte de casamentos. Mas eu SEMPRE me entretinha com outras coisas, quando chegava nessa parte. Eu cuidava das crianças, eu ensinava o Guigo a fazer uma foto das velas acessas nos arranjos, eu arrumava o cabelo da Nina, eu saia de mim. Só que, agora, eu tinha que traduzir o casamento! Eu tinha que ouvir e entender, em inglês, e falar e entender, de novo, em português. Eu tinha que prestar atenção DUAS VEZES em cada uma daquelas frases das quais eu tanto fugia!!! E eu tinha que fazer tudo isso sorrindo, para que ninguém pensasse que eu não estava feliz pela minha prima. Porque eu estava feliz por ela. Muito feliz! Mas eu estava destroçada, por mim mesma.... E o esforço para se conciliar duas coisas tão intensas e tão diferentes era muito grande!
Acabada a cerimônia, nós fomos almoçar e eu sinto que eu só consegui voltar a respirar umas 5hs da tarde, quando tudo já se encerrava e todos começavam a se preparar para o dia seguinte (cerimônia religiosa e festa). Eu fui caminhando com os meus tios, da casa dos pais do noivo até a casa onde estávamos hospedados, peguei minha bolsa e saí: “gente, vou no correio e já volto!”. Não tinha mais correio naquela hora... todo mundo sabia disso...
Então, eu vaguei sem rumo por uma hora, talvez duas. Eu andava e andava, numa cidade minúscula de 3 mil habitantes (se tiver!), evitando uma meia dúzia de ruas, onde estavam as casas que poderiam ter pessoas que me conhecessem. Eu chorei até não poder mais! Eu senti tudo de novo, ali. Eu revi um filme. Eu chorei e orei e pedi muuuuito por aquele casamento e pelo casamento de todo mundo que eu conhecia. Que ninguém mais passasse por aquilo que eu passava! Porque era triste demais, difícil demais, intenso demais....
Quando eu voltei pra casa, minha tia (que também tinha ficado viúva, um ano antes de mim), me pegou pela mão e disse: “vamos comigo? Porque EU quero dar uma volta.” Ela era alguém que me entendia, que sofria a mesma dor, que vivia o mesmo dilema, que estava na mesma situação. E foi tão reconfortante conversar com alguém que me entendesse 100%...
Nós duas andamos por mais umas horas, até as pernas não aguentarem. E chegamos a seguinte conclusão: chega! Já tinha dado! Já tinha sido tempo suficiente pra mim! Eu tinha cuidado das crianças, do trabalho, da casa, dos meus sogros, tinha dedicado tempo aos meus irmãos, aos meus amigos, ao voluntariado...era tempo de cuidar DE MIM! E de namorar, de novo. Ela sabia que eu não sabia nem como começar, que eu não conseguia manter um olhar, que eu não conseguia responder a uma investida, que eu não tinha o menor ânimo de me arrumar e sair. Mas, me incentivou a PRATICAR! Eu decidi que aquela ia ser a minha palavra de ordem, dali pra frente: praticar!!!! Eu ia olhar, mesmo que desse vontade de chorar. Eu ia conversar, mesmo que me sentisse culpada (porque me sentia casada). Ninguém ia saber o que eu tinha por dentro se eu estivesse sorrindo por fora. Então, eu ia responder recados, aceitar convites, sair de casa. Eu IA. E ponto final!
Mas é incrível o que pouco tempo e minha personalidade fazem comigo... na manhã seguinte, eu já estava COMPLETAMENTE envolvida com o casamento religioso. Eu só me preocupava em fotografar a noiva, a família, os preparativos, em fazer o buque (verde e amarelo – lindo!!!), em organizar as lembrancinhas “brasileiras”, em traduzir conversas alheias, em ajudar todo mundo em qualquer coisa que eles me pedissem. E pensava: “amanhã, às 6hs da manhã, eu tenho um trem pra Praga! Só eu! Então, A PARTIR DE AMANHÃ, a nova Miriane começará!...” E lá fui eu, no meio de microfones, balões, fotos e cartões para os noivos, curtir o casamento.
Às 4 e pouco da manhã, quando a festa já tinha acabado, os noivos já tinham ido, só haviam no salão umas 6 ou 7 pessoas. Exatamente 7, na verdade. Dois casais alemães, duas irlandesas e um alemão. E eu. Exausta. E ainda tinha que recolher as lembrancinhas que tinham sobrado. As irlandesas foram embora. Os casais foram dormir. O alemão ficou me ajudando. E eu constatei que EU ERA UMA LÁSTIMA COMO MULHER, mesmo!!!! Precisei esperar todas as outras almas viventes ao redor irem embora para perceber que o moço alemão estava ali, olhando pra mim, conversando comigo até o fim da festa, ajudando a recolher pacotinhos vermelhos e não era só pra ser gentil (até porque os alemães não são, assim, os mais gentis da Terra)!!!!! Afe...
Eu morri de medo, eu travei, eu comecei a falar bobagens em inglês, a ter um sotaque absurdo, a rir (de nervosa). E ele lá, impassível, como todo bom alemão. Só me ajudando. Me acompanhou (carregando a caixa com as coisas) até a porta do quarto. E... nada! Então, eu bati na porta, para minha tia abrir (eu dividia o quarto com ela), e ela não veio. E o moço se aproximou. Deixou a caixa no chão. Arrumou meu cabelo. E eu só pensei: “que bom – ele é loiro, de cabelo meio comprido e liso, do meu tamanho no máximo. Ele é diferente do Fer. Ele tem a voz diferente, o cheiro diferente, tudo diferente.” Porque era pra ser assim, mesmo, diferente!!!! Pra eu não criar expectativa nenhuma pra hora de abrir os olhos....
E então... minha tia abriu a porta!
“Oi Mirys. Desculpa. Esperou muito?”
E ela abriu os olhos direito e viu o moço ali, comigo.
“AhMiryseutovoltandodormir.Entrequandoquiser” (leia tudo rápido porque ela falou assim mesmo, encostou a porta e saiu)
Ele sorriu, sem entender nada (a gente falou português).
Eu sorri, entendendo tudo. Dele, da minha tia, de mim mesma.
E eu fui beijada...
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quinta-feira, 26 de julho de 2012
Interlúdio 14 - que seja do outro lado do mundo, então! (Diário da Mirys)
E nessa toada de estar sozinha, sem querer estar, eu fui levando. 1, 2, 3, 6, 8 meses. Levando... Já ia fazer dois anos do acidente e a cronologia do meu estado emocional era, mais ou menos, essa: nos primeiros 13 ou 14 meses, eu não conseguia NEM PENSAR na hipótese de ter outra pessoa. Nos primeiros meses, na verdade, eu não podia nem falar no Fernando ou em qualquer outro relacionamento de homem / mulher... eu tinha que sorrir, pedir licença e sair de perto, procurando o banheiro mais próximo! Não riam! É sério! Ridículo, mas sério, falar nesse assunto (“relacionamentos”) era apertar alguns botões dentro de mim e ter ânsia e desarranjar meu estômago/intestino, na hora!!! Automaticamente!!! Não sei como não emagreci todos meus 50 e poucos quilos....
Lá pelo 15º ou 16º mês, a companhia das crianças já não me bastava mais (eu AMAVA ficar com eles, mas não era o suficiente, entendem?), o meu trabalho não me realizava completamente, os meus hobbies e distrações não me satisfaziam... faltava alguma coisa. Faltava algo IMPORTANTE! Faltava alguém, aquele alguém capaz de me fazer sorrir com qualquer bobagem que falasse, aquele alguém que me abraçasse, me beijasse, me quisesse, aquele alguém que fizesse meu celular tocar, meu coração acelerar, minha voz falsear, que tirasse tudo do lugar e rearrumasse de um jeito só dele. Alguém pra quem voltar. Alguém por quem esperar ansiosamente no fim do dia, da semana, de uma quarta-feira qualquer.
Eu queria viver tudo aquilo, de novo, mas não sabia nem por onde começar! Eu não sabia mais namorar (eu tinha ficado com o Fernando por 16 anos e tra-la-lá, até ficar viúva dele... e isso é tempo demais), não sabia nem olhar para o lado, não sabia ser a Miriane na versão solteira. Afinal, eu tinha me empenhado tanto em ser a melhor Miriane que eu conseguisse, na versão mãe, na versão filha, na versão nora, na versão irmã, na versão amiga, na versão profissional... eu tinha consumido tanto tempo e energia com isso, nos últimos anos. Até ser esposa eu sabia. Eu me lembrava! Porque “esposa” eu tinha sido, há pouco tempo atrás... mas namorada, não! Paquera, não!
Na verdade, eu MORRIA DE MEDO de um momento em especial: o depois do beijo. Na minha cabecinha confusa, eu pensava que eu podia “até beijar” alguém... mas eu não iria abrir meus olhos nunca mais! Porque e se eu abrisse os olhos, esperando ver o Fer, e não fosse ele quem estivesse lá?????? O que eu faria???? Crise de choro? Crise de riso (eu tenho isso quando fico super nervosa)? Sentiria um vazio maior ainda? Me sentiria traidora? Me sentiria abandonada? E eu sabia que não seria ele que estaria lá... é claro que não seria...
Perdida nessa minha loucura de viuvez, eu não beijei ninguém. E pior: eu achava que não beijava porque ninguém queria me beijar, sem perceber que a “culpa” era minha mesmo, e dos meus medos completamente irracionais...
Mais tempo se passou e uma prima amadíssima me ligou. Em resumo: “Mirys, vou me casar na Alemanha (com um alemão, claro!), com meu namorado da Irlanda. Mas eu não falo alemão e ele não fala português. Então, o casamento será todo traduzido pro inglês (língua que os dois falavam). Mas, meus pais vem pra cá e eles não falam nem alemão, nem inglês. Você pode vir pra traduzir?” Claro que esse pedido veio no meio de um monte de “Miroca, love you, baby”, “Miroca tô morrendo de saudades”, “Miroca, quero tanto te ver, de novo” – porque eu e as minhas primas somos assim, praticamente irmãs, mesmo!
E eu pensei que só teria um mês para organizar férias, dinheiro, passagem, trabalho, vestido. Que eu não sabia NADA de alemão e que nunca quis ir visitar a Alemanha. Que não teria ninguém para fazer a viagem comigo. Que teria que pedir para a minha mãe largar toooodas as coisas dela e vir pra minha casa, ficar com as minhas crianças, por duas semanas (e eu detesto tirar os outros do conforto deles para resolver as minhas coisas). Que eu não conheceria ninguém naquele casamento, além da minha prima e dos meus tios.
E eu pensei: WHAT THE HELL (tradução livre e light minha: “oras bolas, por que não?”). E eu fui. Quem sabe, lá na Alemanha, eu beijasse alguém?......
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Lá pelo 15º ou 16º mês, a companhia das crianças já não me bastava mais (eu AMAVA ficar com eles, mas não era o suficiente, entendem?), o meu trabalho não me realizava completamente, os meus hobbies e distrações não me satisfaziam... faltava alguma coisa. Faltava algo IMPORTANTE! Faltava alguém, aquele alguém capaz de me fazer sorrir com qualquer bobagem que falasse, aquele alguém que me abraçasse, me beijasse, me quisesse, aquele alguém que fizesse meu celular tocar, meu coração acelerar, minha voz falsear, que tirasse tudo do lugar e rearrumasse de um jeito só dele. Alguém pra quem voltar. Alguém por quem esperar ansiosamente no fim do dia, da semana, de uma quarta-feira qualquer.
Eu queria viver tudo aquilo, de novo, mas não sabia nem por onde começar! Eu não sabia mais namorar (eu tinha ficado com o Fernando por 16 anos e tra-la-lá, até ficar viúva dele... e isso é tempo demais), não sabia nem olhar para o lado, não sabia ser a Miriane na versão solteira. Afinal, eu tinha me empenhado tanto em ser a melhor Miriane que eu conseguisse, na versão mãe, na versão filha, na versão nora, na versão irmã, na versão amiga, na versão profissional... eu tinha consumido tanto tempo e energia com isso, nos últimos anos. Até ser esposa eu sabia. Eu me lembrava! Porque “esposa” eu tinha sido, há pouco tempo atrás... mas namorada, não! Paquera, não!
Na verdade, eu MORRIA DE MEDO de um momento em especial: o depois do beijo. Na minha cabecinha confusa, eu pensava que eu podia “até beijar” alguém... mas eu não iria abrir meus olhos nunca mais! Porque e se eu abrisse os olhos, esperando ver o Fer, e não fosse ele quem estivesse lá?????? O que eu faria???? Crise de choro? Crise de riso (eu tenho isso quando fico super nervosa)? Sentiria um vazio maior ainda? Me sentiria traidora? Me sentiria abandonada? E eu sabia que não seria ele que estaria lá... é claro que não seria...
Perdida nessa minha loucura de viuvez, eu não beijei ninguém. E pior: eu achava que não beijava porque ninguém queria me beijar, sem perceber que a “culpa” era minha mesmo, e dos meus medos completamente irracionais...
Mais tempo se passou e uma prima amadíssima me ligou. Em resumo: “Mirys, vou me casar na Alemanha (com um alemão, claro!), com meu namorado da Irlanda. Mas eu não falo alemão e ele não fala português. Então, o casamento será todo traduzido pro inglês (língua que os dois falavam). Mas, meus pais vem pra cá e eles não falam nem alemão, nem inglês. Você pode vir pra traduzir?” Claro que esse pedido veio no meio de um monte de “Miroca, love you, baby”, “Miroca tô morrendo de saudades”, “Miroca, quero tanto te ver, de novo” – porque eu e as minhas primas somos assim, praticamente irmãs, mesmo!
E eu pensei que só teria um mês para organizar férias, dinheiro, passagem, trabalho, vestido. Que eu não sabia NADA de alemão e que nunca quis ir visitar a Alemanha. Que não teria ninguém para fazer a viagem comigo. Que teria que pedir para a minha mãe largar toooodas as coisas dela e vir pra minha casa, ficar com as minhas crianças, por duas semanas (e eu detesto tirar os outros do conforto deles para resolver as minhas coisas). Que eu não conheceria ninguém naquele casamento, além da minha prima e dos meus tios.
E eu pensei: WHAT THE HELL (tradução livre e light minha: “oras bolas, por que não?”). E eu fui. Quem sabe, lá na Alemanha, eu beijasse alguém?......
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quarta-feira, 25 de julho de 2012
Interlúdio 13 - URGÊNCIA! (Diário da Mirys)
Depois que você vê a morte bem de pertinho, quando alguém “improvável” (jovem, saudável, no auge) morre, dá uma urgência absurda em quem fica!
Urgência de viver!
Urgência de dizer que ama praqueles que ainda estão aqui!
Urgência de perdoar, de aceitar perdão!
Urgência de estar junto com todo mundo!
Urgência de fazer parar o tempo e aproveitar cada segundo!
Eu vivi isso e quase todo mundo que estava ao meu redor viveu, também. Das minhas quatro irmãs que poderiam se casar (as outras ou já estavam casadas ou são muito novas), todas se casaram, num prazo de 13 meses, após o acidente que me deixou viúva. Algumas amigas se aventuraram a ter filhos (ou mais filhos) e pararam de ficar pensando tanto “quando eu terminar a 3ª pos graduação” ou “quando eu tiver bastante dinheiro”. Ouvi diversos relatos de pessoas dizendo que reestabeleceram seus relacionamentos porque não valia a pena ficar brigado com o marido/a mulher por tão pouco. Vi pessoas que passaram anos sem se falar ou se agredindo verbalmente, levantarem a bandeirinha branca e conviverem de um jeito bárbaro, a partir de então. Coisas ótimas aconteceram após o acidente, porque todo mundo ficou com URGÊNCIA DE VIVER DIREITO! Em paz, sem mágoas, com a pessoa que amavam, o mais perto possível.
Pra mim, as urgências eram um pouco diferentes. Eu quis escrever a minha história pras crianças, pra que eles soubessem a minha versão dos fatos e o quão incrível o pai delas era (por isso, comecei o blog). Eu quis acertar todas as pendências financeiras e abri uma poupança pra cada filho. Duas pra cada um, na verdade. Eu fiz uma listinha com senhas e contas e poupanças e logins e deixei com uma amiga muito querida, pra ninguém passar apuro, “caso eu fosse embora, também”... Porque quando você perde seu marido assim, aos 35 anos, numa noite normal, após um dia comum, sem nada pra anunciar... você acha que qualquer um pode ir embora a qualquer momento. Inclusive você! Então, você se garante!
E eu tirei muitos planos do papel! Eu viajei (por mais que doesse), eu visitei amigos, eu liguei pras minhas avós pelo menos 2 vezes por semana, eu criei rituais (tipo: o de sempre ir na casa de uma delas – avós, quando eu chegasse, nos finais de semana), eu bolei festas de aniversário surpresa pra um monte de gente querida, eu investi meu tempo e minha energia nas pessoas!
No meio da minha lista de coisas urgentes a fazer só não tinha um novo relacionamento. Porque, no momento, não dava. Eu não concebia isso... Eu ainda precisava de tempo, minha família precisava de tempo, meus sogros e meu cunhado precisavam de tempo.
Mas eu sabia, no fundinho de mim eu sabia, que SE e QUANDO viesse seria assim: urgente!
Me desculpe quem pensar diferente, mas eu não tenho mais tempo a perder nessa vida, não!
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Urgência de viver!
Urgência de dizer que ama praqueles que ainda estão aqui!
Urgência de perdoar, de aceitar perdão!
Urgência de estar junto com todo mundo!
Urgência de fazer parar o tempo e aproveitar cada segundo!
Eu vivi isso e quase todo mundo que estava ao meu redor viveu, também. Das minhas quatro irmãs que poderiam se casar (as outras ou já estavam casadas ou são muito novas), todas se casaram, num prazo de 13 meses, após o acidente que me deixou viúva. Algumas amigas se aventuraram a ter filhos (ou mais filhos) e pararam de ficar pensando tanto “quando eu terminar a 3ª pos graduação” ou “quando eu tiver bastante dinheiro”. Ouvi diversos relatos de pessoas dizendo que reestabeleceram seus relacionamentos porque não valia a pena ficar brigado com o marido/a mulher por tão pouco. Vi pessoas que passaram anos sem se falar ou se agredindo verbalmente, levantarem a bandeirinha branca e conviverem de um jeito bárbaro, a partir de então. Coisas ótimas aconteceram após o acidente, porque todo mundo ficou com URGÊNCIA DE VIVER DIREITO! Em paz, sem mágoas, com a pessoa que amavam, o mais perto possível.
Pra mim, as urgências eram um pouco diferentes. Eu quis escrever a minha história pras crianças, pra que eles soubessem a minha versão dos fatos e o quão incrível o pai delas era (por isso, comecei o blog). Eu quis acertar todas as pendências financeiras e abri uma poupança pra cada filho. Duas pra cada um, na verdade. Eu fiz uma listinha com senhas e contas e poupanças e logins e deixei com uma amiga muito querida, pra ninguém passar apuro, “caso eu fosse embora, também”... Porque quando você perde seu marido assim, aos 35 anos, numa noite normal, após um dia comum, sem nada pra anunciar... você acha que qualquer um pode ir embora a qualquer momento. Inclusive você! Então, você se garante!
E eu tirei muitos planos do papel! Eu viajei (por mais que doesse), eu visitei amigos, eu liguei pras minhas avós pelo menos 2 vezes por semana, eu criei rituais (tipo: o de sempre ir na casa de uma delas – avós, quando eu chegasse, nos finais de semana), eu bolei festas de aniversário surpresa pra um monte de gente querida, eu investi meu tempo e minha energia nas pessoas!
No meio da minha lista de coisas urgentes a fazer só não tinha um novo relacionamento. Porque, no momento, não dava. Eu não concebia isso... Eu ainda precisava de tempo, minha família precisava de tempo, meus sogros e meu cunhado precisavam de tempo.
Mas eu sabia, no fundinho de mim eu sabia, que SE e QUANDO viesse seria assim: urgente!
Me desculpe quem pensar diferente, mas eu não tenho mais tempo a perder nessa vida, não!
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terça-feira, 24 de julho de 2012
Interlúdio 12 - repelente (Diário da Mirys)
O meu “prazo de validade” pra ficar sozinha já tinha dado! Eu já estava naquela fase de chorar e orar, todas as noites, depois que todos dormiam, pedindo, SE e QUANDO Deus quisesse, que eu tivesse outra pessoa.
Você já ouviu aquela piada famosa do prêmio da loteria? Que a pessoa pede e pede e torce e torce pra ganhar o prêmio acumulado e nunca ganha... até que chega alguém e pergunta “mas você joga?”. Pois é... o fato é que eu não jogava! Por causa das opções que eu tinha feito (de priorizar as crianças e o crescimento delas) e por um monte pouco de desânimo, eu confesso que ficava muuuuito em casa. Durante a semana, eu ficava em casa por motivos óbvios: não tinha ninguém pra ficar com os pequenos para que eu pudesse sair. Nos finais de semana, quando eu estava na casa dos avós das crianças e poderia deixa-los para sair, eu preferia ficar por lá, mesmo. Sempre tinha um filme pra ver, um papo pra colocar em dia, uma organização de coisas, um trabalho pra terminar, ou uma pura e simples falta de companhia (SOLTEIRA) pra sair, mesmo.
Então, eu decidi que, para não sair do jogo completamente, eu tinha que começar a agir nos lugares onde eu JÁ ia de qualquer jeito! Quem sabe aparecesse alguém no mercado, na porta da escola das crianças ou pra trocar uma lâmpada na academia só para mulheres que eu frequentava? Quem sabe?????? Podia acontecer! Improvável, mas não impossível!!!
(Um parênteses pra vocês entenderem que eu já tinha feito muuuuito progresso, nesse tempo! No começo, eu não conseguia olhar para um homem, como uma mulher. Uns 2 ou 3 meses depois do início da viuvez, uma amiga me apontou um moço de terno, todo arrumado, sentado num tribunal onde nós duas estávamos. “Mirys, olha aquilo tudo! O que você acha????” A minha resposta foi “é... ele é esteticamente harmonioso.” A minha amiga não sabia se me batia ou se morria de rir da minha brilhante resposta, dada sem um pingo de emoção na voz, como se eu analisasse a construção de um depósito de materiais para construção. “Mirys, acho que você está assexuada...”. Fecha parênteses)
E, numa noite, eu cheguei na igreja e tinha um moço lindo, no banco da frente. Eu olhei pras costas dele (não riam!!!), olhei pra metade do rosto (ele virou um pouquinho, quando eu me acomodei no banco de trás), olhei pras costas de novo e... comecei a chorar! Eu olhava praquele moço, achava que era bonito e pensava que não podia achar isso dele. E chorava. E chorava. E me forçava a olhar pras costas dele, não importava o vexame que eu desse, mas eu IA OLHAR. Parecia um daqueles desenhos animados, quando uma versão sua de anjinho e outra de diabinho ficam sentadas nos seus ombros. “Olhe!” “Não olhe!” “Olhe! Você não está fazendo nada de errado...” “Não olhe! Você é casada e mulheres casadas não desejam outros homens que não são delas!” O anjinho venceu, eu olhei pro moço e chorei até a hora em que aguentei. Quando achei que meia igreja estava olhando pra mim, eu fui embora pra casa, emocionalmente exausta.
Numa fase tão ridícula dessas, qual é a melhor coisa a se fazer? Aprender a rir de si mesma!!! E a aceitar as suas crises, os seus vexames, os seus limites. E eu comecei a tirar sarro de mim! Quando alguém me perguntava “e aí, alguém já olhou pra você?” ou “e então, alguém já veio atrás de você?”, eu respondia que não, mas que tudo bem... eu devia andar com uma plaquinha, no pescoço, mesmo, escrito “CUIDADO, VIÚVA BRAVA”, e que ninguém ia se aproximar com uma plaquinha dessas, né? As pessoas riam, eu ria, todo mundo se divertia e mais uma noite acabava. Ou então, eu respondia que eu devia usar algum tipo de repelente especial, que nem moço, nem mosca chegavam perto de mim. Riu? Eu ri! Tava sozinha, mas tava rindo!
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Você já ouviu aquela piada famosa do prêmio da loteria? Que a pessoa pede e pede e torce e torce pra ganhar o prêmio acumulado e nunca ganha... até que chega alguém e pergunta “mas você joga?”. Pois é... o fato é que eu não jogava! Por causa das opções que eu tinha feito (de priorizar as crianças e o crescimento delas) e por um monte pouco de desânimo, eu confesso que ficava muuuuito em casa. Durante a semana, eu ficava em casa por motivos óbvios: não tinha ninguém pra ficar com os pequenos para que eu pudesse sair. Nos finais de semana, quando eu estava na casa dos avós das crianças e poderia deixa-los para sair, eu preferia ficar por lá, mesmo. Sempre tinha um filme pra ver, um papo pra colocar em dia, uma organização de coisas, um trabalho pra terminar, ou uma pura e simples falta de companhia (SOLTEIRA) pra sair, mesmo.
Então, eu decidi que, para não sair do jogo completamente, eu tinha que começar a agir nos lugares onde eu JÁ ia de qualquer jeito! Quem sabe aparecesse alguém no mercado, na porta da escola das crianças ou pra trocar uma lâmpada na academia só para mulheres que eu frequentava? Quem sabe?????? Podia acontecer! Improvável, mas não impossível!!!
(Um parênteses pra vocês entenderem que eu já tinha feito muuuuito progresso, nesse tempo! No começo, eu não conseguia olhar para um homem, como uma mulher. Uns 2 ou 3 meses depois do início da viuvez, uma amiga me apontou um moço de terno, todo arrumado, sentado num tribunal onde nós duas estávamos. “Mirys, olha aquilo tudo! O que você acha????” A minha resposta foi “é... ele é esteticamente harmonioso.” A minha amiga não sabia se me batia ou se morria de rir da minha brilhante resposta, dada sem um pingo de emoção na voz, como se eu analisasse a construção de um depósito de materiais para construção. “Mirys, acho que você está assexuada...”. Fecha parênteses)
E, numa noite, eu cheguei na igreja e tinha um moço lindo, no banco da frente. Eu olhei pras costas dele (não riam!!!), olhei pra metade do rosto (ele virou um pouquinho, quando eu me acomodei no banco de trás), olhei pras costas de novo e... comecei a chorar! Eu olhava praquele moço, achava que era bonito e pensava que não podia achar isso dele. E chorava. E chorava. E me forçava a olhar pras costas dele, não importava o vexame que eu desse, mas eu IA OLHAR. Parecia um daqueles desenhos animados, quando uma versão sua de anjinho e outra de diabinho ficam sentadas nos seus ombros. “Olhe!” “Não olhe!” “Olhe! Você não está fazendo nada de errado...” “Não olhe! Você é casada e mulheres casadas não desejam outros homens que não são delas!” O anjinho venceu, eu olhei pro moço e chorei até a hora em que aguentei. Quando achei que meia igreja estava olhando pra mim, eu fui embora pra casa, emocionalmente exausta.
Numa fase tão ridícula dessas, qual é a melhor coisa a se fazer? Aprender a rir de si mesma!!! E a aceitar as suas crises, os seus vexames, os seus limites. E eu comecei a tirar sarro de mim! Quando alguém me perguntava “e aí, alguém já olhou pra você?” ou “e então, alguém já veio atrás de você?”, eu respondia que não, mas que tudo bem... eu devia andar com uma plaquinha, no pescoço, mesmo, escrito “CUIDADO, VIÚVA BRAVA”, e que ninguém ia se aproximar com uma plaquinha dessas, né? As pessoas riam, eu ria, todo mundo se divertia e mais uma noite acabava. Ou então, eu respondia que eu devia usar algum tipo de repelente especial, que nem moço, nem mosca chegavam perto de mim. Riu? Eu ri! Tava sozinha, mas tava rindo!
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segunda-feira, 23 de julho de 2012
Interlúdio 11 - choro e exigências (Diário da Mirys)
Depois de um tempo (mais de um ano e meio, no meu caso), eu comecei a ficar muuuuito triste de estar sozinha. Mas, entendam o muito como “muito x 1 milhão, elevado à décima potência”. Algo do tipo....
Era um fato pra mim que eu não gostava de viver a vida assim, vôo solo, sem ter ninguém com quem compartilhar. Eu não nasci pra isso, como diz meu amigo W. Eu sou uma pessoa de relacionamentos! Não que isso me resuma (como “ser mãe” não me resume. Eu ADORO, mas eu não sou só isso. Ninguém é tão simplório assim, para ser uma coisa só....), mas isso me definia também: eu queria ser o amor de alguém. Eu queria amar alguém.
A vida de “avulsa” é beeeeem mais simples, confesso. É porque você não tem que avisar ninguém de nada, não tem que pedir permissão, não tem que ser ver “vai dar” pra outra pessoa ir em tal compromisso com você. Não, você decide. Então, se eu recebia um convite, numa quinta à tarde, pra ir pra Campo Grande, eu decidia que ia, abastecia o carro, fazia as malas, viajava umas 9hs com as crianças na sexta (feriado) e chegava no Mato Grosso do Sul a tempo de tomar uma cerveja! Se a minha sogra falasse que estava com saudades das crianças, eu colocava os dois no carro, viajava um pouquinho, almoçávamos com a vovó, eu ia pro cinema (pra deixa-los sozinhos um pouco, só se curtindo), pegava os 2 e voltávamos pra casa, no dia seguinte. Pif-paf-pum. Resolvido! Era simples.
Mas eu não queria o simples. Eu queria alguém pra falar “tem jeito de resolver a sua agenda e a gente ir pra Campo Grande?”. Alguém pra compartilhar, pra dividir a vida, pra sonhar e planejar junto, pra ajudar a decidir até aquelas horas vagas (“esse filme ou um vinhozinho?”).
E eu comecei a chorar, toda noite, porque eu não aguentava mais ficar sozinha....
Eu via casais ao meu redor. Curiosamente, eu comecei a ver SÓ casais ao meu redor! E até o braço do meu cunhado, passando atrás das costas da minha irmã, no banco da frente do meu, me incomodava. Porque eu não tinha aquilo! Era tão pouco, era tão insignificante, era “só” um braço nas costas. Sem carinho, sem beijos, sem nada demais... mas eu não tinha nem aquilo! O que eu tinha era MENOS do que aquilo. Era zero.
O “problema” é que eu não “precisava” de ninguém. Eu já tinha aprendido a viver sozinha. Eu cuidava do carro, da roupa e da louça. Eu pagava as contas. Eu sustentava as crianças. Eu redecorava a casa. Eu decidia o jantar, eu fazia o jantar, eu comia o jantar. Ponto. Então, eu fiquei exigente, porque alguém que viesse teria que vir pra acrescentar, pra trazer um algo a mais, pra trazer cor, música, emoção pra vida.
E toda noite, quando eu chorava, eu orava. Em partes, eu orava direito: “Deus, SE o Senhor quiser e QUANDO o Senhor quiser, eu quero ter outra pessoa comigo. O Senhor sabe que eu não aguento mais ficar sozinha, que eu estou muito triste. Mas, se o seu plano for outro, eu entendo.” A partir de então, minha oração ficava parecida com uma análise de curriculum, num departamento de recursos humanos: “mas eu quero alguém que goste de crianças, que não tenha uma história anterior (eu achava que a minha já era pesada demais para uma relação), eu quero alguém que NÃO me conheça de antes, eu quero alguém que seja resolvido financeiramente (eu não fazia a menor questão de ter alguém que pagasse minhas coisas pra mim porque eu mesma pagava. Só não queria alguém que ficasse comigo PORQUE EU pagava as coisas pra ele), eu quero alguém assim e assado”.
E eu continuei orando e chorando, por muitas e muitas e incontáveis noites...
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Era um fato pra mim que eu não gostava de viver a vida assim, vôo solo, sem ter ninguém com quem compartilhar. Eu não nasci pra isso, como diz meu amigo W. Eu sou uma pessoa de relacionamentos! Não que isso me resuma (como “ser mãe” não me resume. Eu ADORO, mas eu não sou só isso. Ninguém é tão simplório assim, para ser uma coisa só....), mas isso me definia também: eu queria ser o amor de alguém. Eu queria amar alguém.
A vida de “avulsa” é beeeeem mais simples, confesso. É porque você não tem que avisar ninguém de nada, não tem que pedir permissão, não tem que ser ver “vai dar” pra outra pessoa ir em tal compromisso com você. Não, você decide. Então, se eu recebia um convite, numa quinta à tarde, pra ir pra Campo Grande, eu decidia que ia, abastecia o carro, fazia as malas, viajava umas 9hs com as crianças na sexta (feriado) e chegava no Mato Grosso do Sul a tempo de tomar uma cerveja! Se a minha sogra falasse que estava com saudades das crianças, eu colocava os dois no carro, viajava um pouquinho, almoçávamos com a vovó, eu ia pro cinema (pra deixa-los sozinhos um pouco, só se curtindo), pegava os 2 e voltávamos pra casa, no dia seguinte. Pif-paf-pum. Resolvido! Era simples.
Mas eu não queria o simples. Eu queria alguém pra falar “tem jeito de resolver a sua agenda e a gente ir pra Campo Grande?”. Alguém pra compartilhar, pra dividir a vida, pra sonhar e planejar junto, pra ajudar a decidir até aquelas horas vagas (“esse filme ou um vinhozinho?”).
E eu comecei a chorar, toda noite, porque eu não aguentava mais ficar sozinha....
Eu via casais ao meu redor. Curiosamente, eu comecei a ver SÓ casais ao meu redor! E até o braço do meu cunhado, passando atrás das costas da minha irmã, no banco da frente do meu, me incomodava. Porque eu não tinha aquilo! Era tão pouco, era tão insignificante, era “só” um braço nas costas. Sem carinho, sem beijos, sem nada demais... mas eu não tinha nem aquilo! O que eu tinha era MENOS do que aquilo. Era zero.
O “problema” é que eu não “precisava” de ninguém. Eu já tinha aprendido a viver sozinha. Eu cuidava do carro, da roupa e da louça. Eu pagava as contas. Eu sustentava as crianças. Eu redecorava a casa. Eu decidia o jantar, eu fazia o jantar, eu comia o jantar. Ponto. Então, eu fiquei exigente, porque alguém que viesse teria que vir pra acrescentar, pra trazer um algo a mais, pra trazer cor, música, emoção pra vida.
E toda noite, quando eu chorava, eu orava. Em partes, eu orava direito: “Deus, SE o Senhor quiser e QUANDO o Senhor quiser, eu quero ter outra pessoa comigo. O Senhor sabe que eu não aguento mais ficar sozinha, que eu estou muito triste. Mas, se o seu plano for outro, eu entendo.” A partir de então, minha oração ficava parecida com uma análise de curriculum, num departamento de recursos humanos: “mas eu quero alguém que goste de crianças, que não tenha uma história anterior (eu achava que a minha já era pesada demais para uma relação), eu quero alguém que NÃO me conheça de antes, eu quero alguém que seja resolvido financeiramente (eu não fazia a menor questão de ter alguém que pagasse minhas coisas pra mim porque eu mesma pagava. Só não queria alguém que ficasse comigo PORQUE EU pagava as coisas pra ele), eu quero alguém assim e assado”.
E eu continuei orando e chorando, por muitas e muitas e incontáveis noites...
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domingo, 22 de julho de 2012
Interlúdio 10 - sozinha, no meio de uma multidão (Diário da Mirys)
Sabe quando você está nervoso, sem querer estar, e alguém te fala: “fica calmo” e você fica mais nervoso???? Sabe aquela sensação irritante de impotência??? Aquela vontade louca de controlar o incontrolável, de fazer a pessoa que conversa com você entender o seu ponto, sem que ela queira entender? Então... pra mim, ficar sozinha era isso. Algo que eu estava e não estava, sem querer estar e não estar. Algo que ninguém entendia! Eu explico...
Fisicamente, eu queria estar sozinha. Pelo menos, em algumas horas, eu queria muito estar sozinha! Mas, não estava... Nos primeiros meses (sim, meses!), após o acidente, minha mãe e minha sogra passavam as semanas na minha casa. Só que era uma casa para pai+mãe+2filhinhos. Então, pra dormir, elas dormiam na minha cama, porque era o melhor que eu tinha a oferecer. No espaço do “pai”, que não existia mais (simplesmente, porque todos os outros estavam ocupados e eu queria manter a vida “normal” das crianças). Quando elas não puderam ir, se certificaram de que uma irmã ou uma amiga minha iria. Porque eu “não podia ficar sozinha” (essa era a frase dos bastidores).
Nos finais de semana, quando eu saia da minha “casa”, íamos pra casa de um dos avós. Porque as crianças tinham tios, primos, avós, amigos naquelas cidades. Tinham a programação da igreja. Tinham as festinhas de aniversários. Porque o mundo não parou e eu queria que os meus filhos estivessem nesse mundo que continuava, da forma mais corriqueira que eu conseguisse. Eu também levava as crianças pra perto dos familiares porque eles (familiares) também tinham perdido um filho/genro/cunhado/irmão, também sofriam (eu sempre achei que a minha dor não me dava carta branca pra desrespeitar ou minimizar a dor dos outros), eles queria, pediam e precisavam das crianças por perto para “pensar em outras coisas”, pra se alegrar, pra ver que a vida continuava. E as crianças SEMPRE alegraram!
Mas, no meu “brilhante” plano, quando o final de semana chegasse, eu poderia deixar as crianças com os avós ou tios e ficar um pouco só comigo mesma. Ir no cinema, passear em qualquer lugar, andar a esmo por aí, basicamente “sumir do mundo” e chorar um pouco. Viver meu luto, que eu não vivia, durante a semana. Só que, de novo, entrava todo mundo em campo com a missão de me salvar de mim mesma e da minha solidão. “Você vai no cinema? Vou junto! Queria meeeeesmo ver esse filme cult que eu não vou entender nada!” “Você vai comprar material escolar pras crianças? Bárbaro! Eu queria mesmo ver umas coisinhas, também” (detalhe, a pessoa não tem filhos, nem estuda!) “Você vai na depilação? Vou junto e a gente aproveita e bate um papinho!” Não adiantava eu falar que não precisava, que tudo bem eu ir sozinha, que eu só ia dar uma volta. Alguém SEMPRE ia junto. Talvez não parecesse tanto assim ou tão sufocante pros outros (até porque eles eram muitos pra se dividir nessa tarefa e sempre tinha alguém que não estava comigo), mas eu confidencio a vocês que isso acontecia em 100% do meu tempo!
PS: isso ficou ainda mais claro pra mim, quando uma outra pessoa, também viúva, estava na casa dos meus pais e, depois de alguns dias vendo o que acontecia, ela brincou comigo: “pelo menos, quando você vai tomar banho, você consegue ir sozinha? Chore por lá!”
E foi assim até que, um dia, do nada, eu me atrevi a falar “não”. “Não, você não vai comigo. Não precisa e eu não quero.” “Mas, Mirys... tuuuuudo que eu tinha planejado pra minha tarde era mesmo refazer as unhas do pé que eu fiz ontem” “Então, faça suas unhas do pé porque EU não vou na pedicure. Eu vou ao cemitério.” “Quer companhia?....” “Não.” Pronto, eu tinha descoberto minha palavra mágica: cemitério. Então, quando eu queria respirar, quando eu achava que o assédio era demais pra mim, eu dizia “posso deixar as crianças aqui um minutinho, que eu preciso sair...” “você vai lá?” “vou. Vou no cemitério.” E saia. Milagrosamente sozinha! Mas, como eu não sou de mentir, eu acabava mesmo indo até o cemitério (e foi assim que eu comecei a visitar “o lugar dele”, uns 9 ou 10 meses depois do acidente).
Fisicamente, foi assim. Eu só estava sozinha, quando estava no cemitério. Fora isso, tinha sempre alguém por perto, “só por garantia”.
Emocionalmente, era outra estória... Emocionalmente, eu estava completa e totalmente sozinha! E como eu ainda me sentia casada, mesmo anos depois de ter ficado viúva, eu mesma “me proibia” de ter outra pessoa e me sentenciava a continuar sozinha. E é um vazio muito grande esse...
Exatamente aí, a confusão se formava. Toda vez que eu recebia um convite pra algo que não estava a fim, tipo ir no casamento do amigo do cunhado do primo do marido de uma amiga/irmã, onde todo mundo ia de casal, eu dizia: “não obrigada, eu não vou. Lá todos vão estar acompanhados e eu estou sozinha....”. E em todas as vezes eu recebia uma resposta do tipo “você não está sozinha. A gente vai estar lá.” Como se estar cercada de gente (conhecida ou não) fosse diminuir a realidade da minha solidão. Como se eu não pudesse me sentir sozinha só porque tinha uma multidão ao meu redor. Estar acompanhada (e não sozinha) fisicamente é diferente de se sentir sozinha emocionalmente. Qual é a grande dificuldade em entender isso?...
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Fisicamente, eu queria estar sozinha. Pelo menos, em algumas horas, eu queria muito estar sozinha! Mas, não estava... Nos primeiros meses (sim, meses!), após o acidente, minha mãe e minha sogra passavam as semanas na minha casa. Só que era uma casa para pai+mãe+2filhinhos. Então, pra dormir, elas dormiam na minha cama, porque era o melhor que eu tinha a oferecer. No espaço do “pai”, que não existia mais (simplesmente, porque todos os outros estavam ocupados e eu queria manter a vida “normal” das crianças). Quando elas não puderam ir, se certificaram de que uma irmã ou uma amiga minha iria. Porque eu “não podia ficar sozinha” (essa era a frase dos bastidores).
Nos finais de semana, quando eu saia da minha “casa”, íamos pra casa de um dos avós. Porque as crianças tinham tios, primos, avós, amigos naquelas cidades. Tinham a programação da igreja. Tinham as festinhas de aniversários. Porque o mundo não parou e eu queria que os meus filhos estivessem nesse mundo que continuava, da forma mais corriqueira que eu conseguisse. Eu também levava as crianças pra perto dos familiares porque eles (familiares) também tinham perdido um filho/genro/cunhado/irmão, também sofriam (eu sempre achei que a minha dor não me dava carta branca pra desrespeitar ou minimizar a dor dos outros), eles queria, pediam e precisavam das crianças por perto para “pensar em outras coisas”, pra se alegrar, pra ver que a vida continuava. E as crianças SEMPRE alegraram!
Mas, no meu “brilhante” plano, quando o final de semana chegasse, eu poderia deixar as crianças com os avós ou tios e ficar um pouco só comigo mesma. Ir no cinema, passear em qualquer lugar, andar a esmo por aí, basicamente “sumir do mundo” e chorar um pouco. Viver meu luto, que eu não vivia, durante a semana. Só que, de novo, entrava todo mundo em campo com a missão de me salvar de mim mesma e da minha solidão. “Você vai no cinema? Vou junto! Queria meeeeesmo ver esse filme cult que eu não vou entender nada!” “Você vai comprar material escolar pras crianças? Bárbaro! Eu queria mesmo ver umas coisinhas, também” (detalhe, a pessoa não tem filhos, nem estuda!) “Você vai na depilação? Vou junto e a gente aproveita e bate um papinho!” Não adiantava eu falar que não precisava, que tudo bem eu ir sozinha, que eu só ia dar uma volta. Alguém SEMPRE ia junto. Talvez não parecesse tanto assim ou tão sufocante pros outros (até porque eles eram muitos pra se dividir nessa tarefa e sempre tinha alguém que não estava comigo), mas eu confidencio a vocês que isso acontecia em 100% do meu tempo!
PS: isso ficou ainda mais claro pra mim, quando uma outra pessoa, também viúva, estava na casa dos meus pais e, depois de alguns dias vendo o que acontecia, ela brincou comigo: “pelo menos, quando você vai tomar banho, você consegue ir sozinha? Chore por lá!”
E foi assim até que, um dia, do nada, eu me atrevi a falar “não”. “Não, você não vai comigo. Não precisa e eu não quero.” “Mas, Mirys... tuuuuudo que eu tinha planejado pra minha tarde era mesmo refazer as unhas do pé que eu fiz ontem” “Então, faça suas unhas do pé porque EU não vou na pedicure. Eu vou ao cemitério.” “Quer companhia?....” “Não.” Pronto, eu tinha descoberto minha palavra mágica: cemitério. Então, quando eu queria respirar, quando eu achava que o assédio era demais pra mim, eu dizia “posso deixar as crianças aqui um minutinho, que eu preciso sair...” “você vai lá?” “vou. Vou no cemitério.” E saia. Milagrosamente sozinha! Mas, como eu não sou de mentir, eu acabava mesmo indo até o cemitério (e foi assim que eu comecei a visitar “o lugar dele”, uns 9 ou 10 meses depois do acidente).
Fisicamente, foi assim. Eu só estava sozinha, quando estava no cemitério. Fora isso, tinha sempre alguém por perto, “só por garantia”.
Emocionalmente, era outra estória... Emocionalmente, eu estava completa e totalmente sozinha! E como eu ainda me sentia casada, mesmo anos depois de ter ficado viúva, eu mesma “me proibia” de ter outra pessoa e me sentenciava a continuar sozinha. E é um vazio muito grande esse...
Exatamente aí, a confusão se formava. Toda vez que eu recebia um convite pra algo que não estava a fim, tipo ir no casamento do amigo do cunhado do primo do marido de uma amiga/irmã, onde todo mundo ia de casal, eu dizia: “não obrigada, eu não vou. Lá todos vão estar acompanhados e eu estou sozinha....”. E em todas as vezes eu recebia uma resposta do tipo “você não está sozinha. A gente vai estar lá.” Como se estar cercada de gente (conhecida ou não) fosse diminuir a realidade da minha solidão. Como se eu não pudesse me sentir sozinha só porque tinha uma multidão ao meu redor. Estar acompanhada (e não sozinha) fisicamente é diferente de se sentir sozinha emocionalmente. Qual é a grande dificuldade em entender isso?...
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sábado, 21 de julho de 2012
Interlúdio 9 - sobre elogios (Diário da Mirys)
No começo, bem no começo, é normal as pessoas quererem “te alegrar”, te deixar pra cima, então eu ouvi muitos “você é/está/ficou linda!”. Qualquer calça jeans + camiseta já arrancava “uau”s, pela casa da minha mãe e das minhas amigas. Espetáculo!!!
Foi bom, muito bom... até porque eu SABIA que NÃO estava linda! Não estava. Fato! Pós acidente, eu ganhei inúmeras espinhas (pelo rosto e pelo corpo). Segundo meu médico, o stress tinha que sair por algum lugar (porque eu não estava me descabelando, me jogando na comida, emagrecendo, nada... então, eu TINHA que ter alguma válvula de escape porque a situação era altamente estressante. A minha pele foi minha válvula de escape...). Eu tinha olheiras que poderiam muito bem ser chamadas de “bochecheiras”, tão grandes elas eram. Eu estava abatida. Eu estava desencantada com a vida. Eu estava triste, oras bolas. Eu estava tristíssima!
Mas eu me esforçava muuuuuuuuuuuuuito para não parecer tão triste assim! Afinal, no meio do furação, tinham duas crianças, lembram? E elas precisavam ver a mãe bem para que elas também ficassem bem. Então, eu segurava minha onda, vestia o meu melhor sorriso, inventava coisas para preencher o dia, me esforçava ao MÁXIMO do que me restava de forças para parecer “aceitável”, pelo menos. Então, era um alívio ouvir que eu estava bonita. Era mentira, eu sabia. Mas, considerando que eu não estava sob condições normais de temperatura e pressão, eu não estava tão mal assim e podia me dar algum crédito!
Só que, depois de um tempo, esse negócio de “você é/está/ficou linda” pra qualquer moleton, começou a soar como piada. Ou, na melhor das hipóteses, como um chavão! Até porque, em 99% das vezes, eu ouvia isso de MULHERES!!! É, na casa da minha mãe, nós somos em DEZ mulheres! Mais minhas amigas, mais minhas tias e primas. Pronto! Eu tinha um exército de mulheres me dizendo que eu era a última bolacha do pacote!!! Mas... quem quer ser bonita só pra opinião feminina??????
Irmãs, mãe, tias, primas, sogra, amigas: me desculpem, do fundo do coração, mas a opinião de vocês era “café com leite”, tá? E eu cheguei a dizer isso pra algumas delas....
Só que eu tinha um problema crônico de continuar me sentindo casada e, sendo casada, eu só encarava opiniões masculinas sobre o meu aspecto físico como sendo “um elogio de um amigo” e nada mais. E você (homem amigo opinante) tem que ter muuuuuitaaaaa intimidade com um casal para poder falar pra mulher do seu amigo que ela está bem. E eu só não me senti COMPLETAMENTE INVISÍVEL para o universo masculino porque alguns desses amigos nossos, muito íntimos, me fizeram feliz...
Tudo bem que eles não contavam nem 0,00000000001 como futuros namorados (porque eles eram meus amigos e só!), mas é muito mais legal ouvir um “você está linda”, com um timbre de voz mais grave. Oh se é!!!
Alguns desses elogios me marcaram e, de certa forma, me fizeram mudar de direção e cuidar um pouco mais de mim...
1 – num dia de palestras, eu coloquei a boa dupla jeans + camisa branca, mas achei que faltava algo. Coloquei um colar de pérolas e pintei as unhas de vermelho (no ônibus, em sampa! #alouca). Saindo do curso, um amigo me disse: “pense em mim como a Whoopi Goldberg, no filme Ghost... porque me pediram pra te dizer que você está linda!” E eu voltei chorando pelo metrô (decidida a sempre pintar minhas unhas de vermelho, onde quer que me desse vontade!). P., nunca poderei te agradecer a injeção de ânimo daquele dia!
2 – numa tarde, num boteco qualquer de sampa, conversando com um amigo/irmão de longa data, falávamos sobre homens e sobre o fato de eu ainda estar sozinha. Que eu achava que estava feinha, largada, descuidada, sei lá (eu tinha intimidade pra tanto, tá?). E ele me perguntou se poderia dar a opinião masculina dele, ignorando o fato de ser meu grande amigo. “Manda” (acho que eu até fechei os olhos pra esperar o direto no estômago que eu ia tomar....). “Mirys, você tá ótima! Você está com um corpaço e, quando você sorri, seu rosto fica lindo. Se eu fosse solteiro, eu pegava!”. Eu gargalhei!!! P., love you and you know it!
3 – eu termino de me arrumar pra uma festa, sem a menoooooor vontade de fazer maquiagem, nem nada. A Nina insiste e eu passo um baton e acentuo o olho com um lápis. Quando vamos encontrar nossos amigos que nos dariam carona, um deles me olha de cima a baixo, sorri e diz “Você vem sempre aqui?”. O meu sorriso foi instantâneo. Me lembrei do Joe, no friends “how you doing?....” (friendsmaníacas me entenderão). Eu entendi que algumas mudanças, mesmo que pequenas, DEVEM ser feitas. M., você não tem ideia de como aquela sua frase fez mudar o jeito que eu via a mim mesma! Obrigada!
4 – no meio de um culto (inadequado... eu sei!), um amigo me manda um torpedo. “Esse vestido ficou ótimo pra você. Impressionante... você continua linda!”. O “continua” da frase me marcou. Graças ao R., eu comecei a usar mais vestidos...
E eu esperava o dia (será?) em que ouviria isso de alguém que TIVESSE algum interesse por mim....
Cenas do próximo capítulo aqui
Foi bom, muito bom... até porque eu SABIA que NÃO estava linda! Não estava. Fato! Pós acidente, eu ganhei inúmeras espinhas (pelo rosto e pelo corpo). Segundo meu médico, o stress tinha que sair por algum lugar (porque eu não estava me descabelando, me jogando na comida, emagrecendo, nada... então, eu TINHA que ter alguma válvula de escape porque a situação era altamente estressante. A minha pele foi minha válvula de escape...). Eu tinha olheiras que poderiam muito bem ser chamadas de “bochecheiras”, tão grandes elas eram. Eu estava abatida. Eu estava desencantada com a vida. Eu estava triste, oras bolas. Eu estava tristíssima!
Mas eu me esforçava muuuuuuuuuuuuuito para não parecer tão triste assim! Afinal, no meio do furação, tinham duas crianças, lembram? E elas precisavam ver a mãe bem para que elas também ficassem bem. Então, eu segurava minha onda, vestia o meu melhor sorriso, inventava coisas para preencher o dia, me esforçava ao MÁXIMO do que me restava de forças para parecer “aceitável”, pelo menos. Então, era um alívio ouvir que eu estava bonita. Era mentira, eu sabia. Mas, considerando que eu não estava sob condições normais de temperatura e pressão, eu não estava tão mal assim e podia me dar algum crédito!
Só que, depois de um tempo, esse negócio de “você é/está/ficou linda” pra qualquer moleton, começou a soar como piada. Ou, na melhor das hipóteses, como um chavão! Até porque, em 99% das vezes, eu ouvia isso de MULHERES!!! É, na casa da minha mãe, nós somos em DEZ mulheres! Mais minhas amigas, mais minhas tias e primas. Pronto! Eu tinha um exército de mulheres me dizendo que eu era a última bolacha do pacote!!! Mas... quem quer ser bonita só pra opinião feminina??????
Irmãs, mãe, tias, primas, sogra, amigas: me desculpem, do fundo do coração, mas a opinião de vocês era “café com leite”, tá? E eu cheguei a dizer isso pra algumas delas....
Só que eu tinha um problema crônico de continuar me sentindo casada e, sendo casada, eu só encarava opiniões masculinas sobre o meu aspecto físico como sendo “um elogio de um amigo” e nada mais. E você (homem amigo opinante) tem que ter muuuuuitaaaaa intimidade com um casal para poder falar pra mulher do seu amigo que ela está bem. E eu só não me senti COMPLETAMENTE INVISÍVEL para o universo masculino porque alguns desses amigos nossos, muito íntimos, me fizeram feliz...
Tudo bem que eles não contavam nem 0,00000000001 como futuros namorados (porque eles eram meus amigos e só!), mas é muito mais legal ouvir um “você está linda”, com um timbre de voz mais grave. Oh se é!!!
Alguns desses elogios me marcaram e, de certa forma, me fizeram mudar de direção e cuidar um pouco mais de mim...
1 – num dia de palestras, eu coloquei a boa dupla jeans + camisa branca, mas achei que faltava algo. Coloquei um colar de pérolas e pintei as unhas de vermelho (no ônibus, em sampa! #alouca). Saindo do curso, um amigo me disse: “pense em mim como a Whoopi Goldberg, no filme Ghost... porque me pediram pra te dizer que você está linda!” E eu voltei chorando pelo metrô (decidida a sempre pintar minhas unhas de vermelho, onde quer que me desse vontade!). P., nunca poderei te agradecer a injeção de ânimo daquele dia!
2 – numa tarde, num boteco qualquer de sampa, conversando com um amigo/irmão de longa data, falávamos sobre homens e sobre o fato de eu ainda estar sozinha. Que eu achava que estava feinha, largada, descuidada, sei lá (eu tinha intimidade pra tanto, tá?). E ele me perguntou se poderia dar a opinião masculina dele, ignorando o fato de ser meu grande amigo. “Manda” (acho que eu até fechei os olhos pra esperar o direto no estômago que eu ia tomar....). “Mirys, você tá ótima! Você está com um corpaço e, quando você sorri, seu rosto fica lindo. Se eu fosse solteiro, eu pegava!”. Eu gargalhei!!! P., love you and you know it!
3 – eu termino de me arrumar pra uma festa, sem a menoooooor vontade de fazer maquiagem, nem nada. A Nina insiste e eu passo um baton e acentuo o olho com um lápis. Quando vamos encontrar nossos amigos que nos dariam carona, um deles me olha de cima a baixo, sorri e diz “Você vem sempre aqui?”. O meu sorriso foi instantâneo. Me lembrei do Joe, no friends “how you doing?....” (friendsmaníacas me entenderão). Eu entendi que algumas mudanças, mesmo que pequenas, DEVEM ser feitas. M., você não tem ideia de como aquela sua frase fez mudar o jeito que eu via a mim mesma! Obrigada!
4 – no meio de um culto (inadequado... eu sei!), um amigo me manda um torpedo. “Esse vestido ficou ótimo pra você. Impressionante... você continua linda!”. O “continua” da frase me marcou. Graças ao R., eu comecei a usar mais vestidos...
E eu esperava o dia (será?) em que ouviria isso de alguém que TIVESSE algum interesse por mim....
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sexta-feira, 20 de julho de 2012
Interlúdio 8 - a viúva e a plaquinha de neon
Ser viúva é andar com uma plaquinha pendurada no pescoço, com letras luminosas em neon rosa, setinhas apontando pra você, e uma sirene acoplada. Funcionando! A todo vapor! Ser viúva numa cidade razoavelmente pequena é tudo isso... em cima de um carro alegórico, com um locutor beeeem estridente dizendo “pamonhas, pamonhas, pamonhas, pamonhas de Piracicaba” “viúva, viúva, viúva, viúva de Jaú”!
Se você acha que estou exagerando e que não era bem assim, meu amigo, deixa eu te contar: você só pensa desse jeito porque você não estava do lado de cá! Do lado de cá, a coisa é bem mais complexa e desagradável... Eu cheguei a ser apontada no shopping, gente que eu não conhecia veio se apresentar pra mim (“você que é aquela moça que o marido morreu naquele acidente?”), comentavam sobre mim nas rodas de amigos das minhas amigas... Exagero meu? Imagina... Eu também pensava assim, que eu não era tãããão importante... Até que um moço, que eu nunca tinha visto antes, se apresentou pra mim, numa fila de um restaurante. “Você que era mulher daquele cara do acidente enorme da estrada, há um mês atrás?” “Sim, sou...” (eu já tenho os olhos puxados pra baixo, então eu já tenho cara de cachorrinho abandonado que caiu do caminhão de mudança... imaginem a minha cara, NA HORA... eu estava preparada para mais um pouco de solidariedade do tipo “tadinha...”) “Vou te contar, viu? Cara estúpido! Não tinha nada que querer ir ajudar os outros! Se tivesse ficado no carro dele e continuado a viagem, agora ele estaria com a família dele. Quanta idiotice...”
Mas o que me deixava mais inconformada, mesmo, era a famosa frase: “tadinha, tão bonita, tão inteligente, tão novinha, não merecia ficar viúva...” Por que???? Quem é feia, burra e/ou mais velha merece????? Ser viúva, agora, é questão de “merecimento”??? Perdi a conta de quantas e quantas vezes eu ouvi essa mesmíssima frase... E eu nem tinha uma resposta pra ela....
Até que um dia, a minha filha, no auge dos seus 4 anos, me perguntou “o que era viúva” (quando mais uma pessoa veio me falar a frase acima). Eu expliquei que era quem era casado, mas que o marido ou a mulher tinha morrido. “Ah... tipo você?” “Isso filha, tipo eu.” Só que a Nina estava naquela fase de começar a ler e escrever e achava o má-xi-mo palavras novas!!!! Então, eu comecei a ser apresentada assim, pros amigos novos dela: “Essa é a minha mãe Miriane. Ela é viúva, sabia?” E lá ia eu sorrir e explicar pra mais uma criança o que era ser viúva!... Mas, não pensem vocês que a Nina se incomodava com isso, não. Pra ela era só uma palavra nova... de novo, o problema (quando ele existia) era meu, não dela... E eu queria que fosse assim, que eles lidassem com tudo da forma mais “natural” possível...
Como nós acabamos nos mudando de casa algumas vezes, depois do acidente, era comum eu ser “anunciada” nos lugares novos como “essa é a Miriane / mãe do Guilherme / mãe da Helena, e ela é viúva. Acredita?”. Lógico que tudo acontecia ANTES de eu chegar (um ano ou dois, depois, alguém que participou do anuncia sempre te conta!). Então, eu chegava, todo mundo sorria, eu sorria e seguia com a vida. Mas eu SABIA que, quando me virava pra ir, muita gente comentava sobre a situação (e eu confirmei, depois, quase todos os cochichos que eu jurava que ouvia). E, invariavelmente, uns meses depois, alguém vinha comentar comigo... “quando me contaram que VOCÊ era A viúva, eu quase não acreditei... você parece tão alegre...”.
Até que chegou um dia, em que eu me revoltei e cansei de usar a tal placa com as letras em neon! Já ia fazer 2 anos e eu resolvi jogar aquela placa fora, arremessa-la de um precipício, fazer uma fogueirinha com ela e dançar ao redor!!!! Mas acabei trocando por outra.... (mais engraçada, pelo menos ;) )
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Se você acha que estou exagerando e que não era bem assim, meu amigo, deixa eu te contar: você só pensa desse jeito porque você não estava do lado de cá! Do lado de cá, a coisa é bem mais complexa e desagradável... Eu cheguei a ser apontada no shopping, gente que eu não conhecia veio se apresentar pra mim (“você que é aquela moça que o marido morreu naquele acidente?”), comentavam sobre mim nas rodas de amigos das minhas amigas... Exagero meu? Imagina... Eu também pensava assim, que eu não era tãããão importante... Até que um moço, que eu nunca tinha visto antes, se apresentou pra mim, numa fila de um restaurante. “Você que era mulher daquele cara do acidente enorme da estrada, há um mês atrás?” “Sim, sou...” (eu já tenho os olhos puxados pra baixo, então eu já tenho cara de cachorrinho abandonado que caiu do caminhão de mudança... imaginem a minha cara, NA HORA... eu estava preparada para mais um pouco de solidariedade do tipo “tadinha...”) “Vou te contar, viu? Cara estúpido! Não tinha nada que querer ir ajudar os outros! Se tivesse ficado no carro dele e continuado a viagem, agora ele estaria com a família dele. Quanta idiotice...”
Mas o que me deixava mais inconformada, mesmo, era a famosa frase: “tadinha, tão bonita, tão inteligente, tão novinha, não merecia ficar viúva...” Por que???? Quem é feia, burra e/ou mais velha merece????? Ser viúva, agora, é questão de “merecimento”??? Perdi a conta de quantas e quantas vezes eu ouvi essa mesmíssima frase... E eu nem tinha uma resposta pra ela....
Até que um dia, a minha filha, no auge dos seus 4 anos, me perguntou “o que era viúva” (quando mais uma pessoa veio me falar a frase acima). Eu expliquei que era quem era casado, mas que o marido ou a mulher tinha morrido. “Ah... tipo você?” “Isso filha, tipo eu.” Só que a Nina estava naquela fase de começar a ler e escrever e achava o má-xi-mo palavras novas!!!! Então, eu comecei a ser apresentada assim, pros amigos novos dela: “Essa é a minha mãe Miriane. Ela é viúva, sabia?” E lá ia eu sorrir e explicar pra mais uma criança o que era ser viúva!... Mas, não pensem vocês que a Nina se incomodava com isso, não. Pra ela era só uma palavra nova... de novo, o problema (quando ele existia) era meu, não dela... E eu queria que fosse assim, que eles lidassem com tudo da forma mais “natural” possível...
Como nós acabamos nos mudando de casa algumas vezes, depois do acidente, era comum eu ser “anunciada” nos lugares novos como “essa é a Miriane / mãe do Guilherme / mãe da Helena, e ela é viúva. Acredita?”. Lógico que tudo acontecia ANTES de eu chegar (um ano ou dois, depois, alguém que participou do anuncia sempre te conta!). Então, eu chegava, todo mundo sorria, eu sorria e seguia com a vida. Mas eu SABIA que, quando me virava pra ir, muita gente comentava sobre a situação (e eu confirmei, depois, quase todos os cochichos que eu jurava que ouvia). E, invariavelmente, uns meses depois, alguém vinha comentar comigo... “quando me contaram que VOCÊ era A viúva, eu quase não acreditei... você parece tão alegre...”.
Até que chegou um dia, em que eu me revoltei e cansei de usar a tal placa com as letras em neon! Já ia fazer 2 anos e eu resolvi jogar aquela placa fora, arremessa-la de um precipício, fazer uma fogueirinha com ela e dançar ao redor!!!! Mas acabei trocando por outra.... (mais engraçada, pelo menos ;) )
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quinta-feira, 19 de julho de 2012
Interlúdio 7 - a minha escolha (Diário da Mirys)
Como eu vivo dizendo: é mais fácil acreditar (e confiar) quando você já sabe o final da história. É claro que é! Se você sabe que esse caminho VAI DAR CERTO, você vai por ele. Lógico! Mas, o duro de ficar viúva cedo é que você (graças a tudo!) não tem muitos referenciais por perto...e você simplesmente não sabe o que vai dar certo e o que não.
Hoje, olhando pra trás, eu percebo que, desde o começo, eu fiz uma escolha: cuidar das crianças e garantir que elas ficassem bem. Ser mãe tinha sido uma decisão bem consciente pra mim e eu ADORAVA a tarefa. Ser mãe SOZINHA tinha sido imprevisível e indesejado. Mas... aconteceu. E, quando eu dei por mim, assegurar a saúde física e emocional daquelas duas pessoinhas era minha prioridade.
Só que cuidar das comidas, das roupas, das brincadeiras, das tarefas de escola, das viagens pras casas das avós, fazer picnics em casa para integra-los a amigos novos das cidades novas, ler histórias, fazer orações, marcar médicos, levar no dentista, consumia muito do meu tempo. E eu ainda era a única responsável por colocar dinheiro dentro de casa! E ainda tinha a casa e o carro pra cuidar!!! Eu comecei a entender de motor de carro, dos diferentes óleos para diferentes funções; eu aprendi a trocar lâmpadas, furar paredes, montar armários; eu matava baratas como ninguém e lavava o carro às quintas-feiras (pra gente viajar toda-santa-sexta)! Um espetáculo!!! rsrsrs
Mas, no meio disso tudo, não sobrava muito tempo PRA MIM! Pra minha dor, pro meu luto, pras minhas questões, pra sair com amigas, pra passar um baton. Mas, honestamente? Talvez tenha sido melhor assim. Meu tempo estava completamente consumido com coisas importantes e úteis, e não sobravam muitos minutos pra ficar pensando besteiras. As crianças e o mundo delas me preenchiam!
Quando sobrava tempo (ou quando era insuportável demais e eu precisava extravasar), era um tempinho de nada, geralmente no meio da madrugada, quando eu conseguia ficar sozinha. Eu e meus livros, meus filmes, minhas orações, meu blog. Cansei de chorar no meio da madrugada, vendo filmes, escrevendo aqui nesse espaço, tentando ler (confesso que parei de ler MUITO depois do acidente. Não me concentro mais...). Foram várias e várias noites...
Como sempre, o tempo foi passando e a vida ao redor de mim foi se acomodando. Eu parei de me mudar de cidade, as crianças criaram seu círculo de amigos, minhas irmãs se casaram, meus amigos voltaram para a vida normal deles, meus pais e meus sogros retornaram para os cotidianos que tinham antes. E que bom que tudo estava assim, normal, de novo! Só que, pra mim, a vida não tinha nada de normal, nada de conhecida. Eu estava numa cidade nova, com amigos novos, num trabalho novo, frequentando uma igreja nova, numa situação quase nova: a de viúva. Eu não tinha "o meu espaço" em lugar nenhum!!! Eu era velha demais pra circular com as solteiras, eu era jovem demais para fazer parte da trupe das viúvas, eu era avulsa demais para sair com os casais. Em qualquer lugar, eu era um peixe fora d´água...
Nessa ciranda da vida, a minha escolha começou a parecer insuficiente... porque as crianças tinham crescido e estavam seguras, tranquilas, independentes e cada dia precisavam menos de mim. E começou a me sobrar tempo... e faltar companhia... e eu comecei a chorar... toda noite... depois que os dois dormiam...
PS: só pra explicar - uma vez, uns 2 ou 3 meses depois do acidente, eu continuava tentando dar uma vida "normal" às crianças, e nós fomos pro culto. O Guigo sentou do meu lado (a Nina, ainda bem, foi pro colo de uma amiga, do outro lado do templo). E tinha um grupo de fora que ia tocar o louvor. As músicas não eram boas. Os músicos não eram bons (eu sou exigente, eu sei). Mas o baixista ficou bem na minha frente. E o Fernando tocava contra-baixo. E aquele menino, naquela noite, dedilhava o baixo igualzinho ao Fer. E eu fiquei hipnotizada pela mão dele...a saudade ficou incontrolável...e eu comecei a chorar. Baixinho, cantando, mas as lágrimas não paravam de escorrer. E, por uns minutos, eu fiquei lá, absorvida por toda a minha dor, olhando praquele baixista, chorando e cantando, demonstrando publicamente o que eu sofria (como taaaaanta gente tinha me mandado fazer "senão eu iria traumatizar as crianças por elas pensarem que a mãe deles nunca chorava"). Até eu senti um braço no meu rosto. E de novo. E de novo. E, quando olhei pra baixo, o Guigo puxava a manga da blusa dele, cobria a mãozinha, passava a manga no meu rosto, desesperado para enxugar minhas lágrimas, falando: "mãe, não chora. Tá tudo bem. EU estou aqui. Mãe, EU estou aqui." E eu senti que ele estava com um medo horrível de ME perder, também. Não sei como, mas eu parei de chorar, eu sentei e disse pra ele que sim, ele estava ali e eu estava MUITO FELIZ porque ELE estava ali. Porque a Nina estava ali. Que eu estava com saudades do papai, sim, e por isso chorava, mas (respondendo à pergunta dele) que eu não queria ir embora com o papai, que eu queria ficar com eles e que eu era muito muito muito feliz com eles. Eu ganhei um dos melhores abraços da minha vida, naquela noite. Que veio junto de um suspiro de alívio. E, a partir de então, eu não chorei mais na frente deles, a não ser uma lágrima ou outra, algo bem contido, algo que não deixasse dúvidas de que eu estava feliz, apesar de tudo. Pra resolver a minha dor, eu fiz o que devia ter feito sempre: chorei incontrolavelmente, até não ter mais forças pra respirar... DEPOIS que eles já estavam dormindo ou quando eles estavam na casa de outras pessoas. Porque aquela dor, de viúva, de solidão, de incompletude era SÓ minha. E não tinha que ser transferida pra eles. Pelo menos, eu pensei assim...
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Hoje, olhando pra trás, eu percebo que, desde o começo, eu fiz uma escolha: cuidar das crianças e garantir que elas ficassem bem. Ser mãe tinha sido uma decisão bem consciente pra mim e eu ADORAVA a tarefa. Ser mãe SOZINHA tinha sido imprevisível e indesejado. Mas... aconteceu. E, quando eu dei por mim, assegurar a saúde física e emocional daquelas duas pessoinhas era minha prioridade.
Só que cuidar das comidas, das roupas, das brincadeiras, das tarefas de escola, das viagens pras casas das avós, fazer picnics em casa para integra-los a amigos novos das cidades novas, ler histórias, fazer orações, marcar médicos, levar no dentista, consumia muito do meu tempo. E eu ainda era a única responsável por colocar dinheiro dentro de casa! E ainda tinha a casa e o carro pra cuidar!!! Eu comecei a entender de motor de carro, dos diferentes óleos para diferentes funções; eu aprendi a trocar lâmpadas, furar paredes, montar armários; eu matava baratas como ninguém e lavava o carro às quintas-feiras (pra gente viajar toda-santa-sexta)! Um espetáculo!!! rsrsrs
Mas, no meio disso tudo, não sobrava muito tempo PRA MIM! Pra minha dor, pro meu luto, pras minhas questões, pra sair com amigas, pra passar um baton. Mas, honestamente? Talvez tenha sido melhor assim. Meu tempo estava completamente consumido com coisas importantes e úteis, e não sobravam muitos minutos pra ficar pensando besteiras. As crianças e o mundo delas me preenchiam!
Quando sobrava tempo (ou quando era insuportável demais e eu precisava extravasar), era um tempinho de nada, geralmente no meio da madrugada, quando eu conseguia ficar sozinha. Eu e meus livros, meus filmes, minhas orações, meu blog. Cansei de chorar no meio da madrugada, vendo filmes, escrevendo aqui nesse espaço, tentando ler (confesso que parei de ler MUITO depois do acidente. Não me concentro mais...). Foram várias e várias noites...
Como sempre, o tempo foi passando e a vida ao redor de mim foi se acomodando. Eu parei de me mudar de cidade, as crianças criaram seu círculo de amigos, minhas irmãs se casaram, meus amigos voltaram para a vida normal deles, meus pais e meus sogros retornaram para os cotidianos que tinham antes. E que bom que tudo estava assim, normal, de novo! Só que, pra mim, a vida não tinha nada de normal, nada de conhecida. Eu estava numa cidade nova, com amigos novos, num trabalho novo, frequentando uma igreja nova, numa situação quase nova: a de viúva. Eu não tinha "o meu espaço" em lugar nenhum!!! Eu era velha demais pra circular com as solteiras, eu era jovem demais para fazer parte da trupe das viúvas, eu era avulsa demais para sair com os casais. Em qualquer lugar, eu era um peixe fora d´água...
Nessa ciranda da vida, a minha escolha começou a parecer insuficiente... porque as crianças tinham crescido e estavam seguras, tranquilas, independentes e cada dia precisavam menos de mim. E começou a me sobrar tempo... e faltar companhia... e eu comecei a chorar... toda noite... depois que os dois dormiam...
PS: só pra explicar - uma vez, uns 2 ou 3 meses depois do acidente, eu continuava tentando dar uma vida "normal" às crianças, e nós fomos pro culto. O Guigo sentou do meu lado (a Nina, ainda bem, foi pro colo de uma amiga, do outro lado do templo). E tinha um grupo de fora que ia tocar o louvor. As músicas não eram boas. Os músicos não eram bons (eu sou exigente, eu sei). Mas o baixista ficou bem na minha frente. E o Fernando tocava contra-baixo. E aquele menino, naquela noite, dedilhava o baixo igualzinho ao Fer. E eu fiquei hipnotizada pela mão dele...a saudade ficou incontrolável...e eu comecei a chorar. Baixinho, cantando, mas as lágrimas não paravam de escorrer. E, por uns minutos, eu fiquei lá, absorvida por toda a minha dor, olhando praquele baixista, chorando e cantando, demonstrando publicamente o que eu sofria (como taaaaanta gente tinha me mandado fazer "senão eu iria traumatizar as crianças por elas pensarem que a mãe deles nunca chorava"). Até eu senti um braço no meu rosto. E de novo. E de novo. E, quando olhei pra baixo, o Guigo puxava a manga da blusa dele, cobria a mãozinha, passava a manga no meu rosto, desesperado para enxugar minhas lágrimas, falando: "mãe, não chora. Tá tudo bem. EU estou aqui. Mãe, EU estou aqui." E eu senti que ele estava com um medo horrível de ME perder, também. Não sei como, mas eu parei de chorar, eu sentei e disse pra ele que sim, ele estava ali e eu estava MUITO FELIZ porque ELE estava ali. Porque a Nina estava ali. Que eu estava com saudades do papai, sim, e por isso chorava, mas (respondendo à pergunta dele) que eu não queria ir embora com o papai, que eu queria ficar com eles e que eu era muito muito muito feliz com eles. Eu ganhei um dos melhores abraços da minha vida, naquela noite. Que veio junto de um suspiro de alívio. E, a partir de então, eu não chorei mais na frente deles, a não ser uma lágrima ou outra, algo bem contido, algo que não deixasse dúvidas de que eu estava feliz, apesar de tudo. Pra resolver a minha dor, eu fiz o que devia ter feito sempre: chorei incontrolavelmente, até não ter mais forças pra respirar... DEPOIS que eles já estavam dormindo ou quando eles estavam na casa de outras pessoas. Porque aquela dor, de viúva, de solidão, de incompletude era SÓ minha. E não tinha que ser transferida pra eles. Pelo menos, eu pensei assim...
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quarta-feira, 18 de julho de 2012
Interlúdio 6 - lei da compensação (Diário da Mirys)
Eu não acredito na "lei da compensação" pra certas coisas. Mas eu nado contra a correnteza, eu sei...
Hoje em dia é muito comum a gente ouvir isso: "deixa ele fazer tal coisa porque, tadinho, ele já não pode fazer aquilo...". Exemplos vem aos montes: o chefe dele é muito chato, então tudo bem se ele não fizer o serviço tão perfeito (ou se levar coisas do escritório pra casa ou se usar a máquina de xerox para coisas pessoais); a mulher dele (ou o marido dela) é insuportável (ou ciumenta, ou fechada, ou introvertida, ou está sempre tão cansada), então tudo bem se ele ficar bêbado toda sexta e sábado (ou se ele flertar com outras pessoas, ou se ele der mais importância aos amigos do que à família); o filho deles é tão difícil que tudo bem se...
No meu caso, a "lei da compensação" vinha, principalmente, na criação das crianças. "Miriane, você é muito rigorosa! Os coitadinhos já perderam o pai! Porque precisam levar uma bronca desse tamanho se baterem no amiguinho, na escola?..." ou "Miriane, quanto exagero! Os coitadinhos já perderam o pai, que problema tem eles derrubarem (e quebrarem) um aparelho na casa da vovó? Foi sem querer...."
Eu concordo: eles já tinham perdido o pai. Fato! Eram órfãos de pai aos 5 e 3 anos de idade. E, na minha concepção, isso JÁ fazia com que a infância deles fosse bastante diferente da infância do resto das crianças ao redor. Eles não precisavam ser diferentes em mais coisas! Eles não podiam não ter consciência (e consequência) dos atos deles, só porque eles já tinham sofrido algo involuntariamente. Não, eu queria que eles tivessem a infância mais normal possível! Então, eu tentava fazer com os dois e-xa-ta-men-te aquilo que (eu acho que) faria, caso o pai deles ainda estivesse aqui.
Era aceitável? Foi uma coisinha de nada, boba? Peça desculpas e caso encerrado. Foi sem querer? Peça desculpas, dê um jeito de restituir o que se quebrou e caso encerrado. Foi maldade? Peça desculpas e fique de castigo um pouco, pra conversarmos sobre a situação. Cada ação tinha sua reação, na medida e intensidade necessárias e condizentes com a SUA AÇÃO.
Porque a gente não tem que ser educado só quando tem os dois pais. A gente não tem que respeitar os outros só quando não é órfão. A gente não tem direito de fazer o que é inaceitável só porque a gente já "sofreu a nossa cota".
Eu queria que eles fossem crianças felizes, saudáveis, tranquilas, realizadas E obedientes, responsáveis, respeitosas, agradáveis "apesar de". Eu não tinha como apagar um fato da vidinha deles: o pai faleceu, num acidente, numa estrada. Ponto. Mas eu não queria que isso os DEFINISSE!
E tudo o que valia pra eles, valia pra mim! Ser viúva não era desculpa para o indesculpável, pro falar ríspido, pra me comprometer com algo e não cumprir, pra abandonar tudo (crianças inclusive) e ficar chorando num canto (apesar de que, de vez em quando, a vontade era mesmo de sumir...). Eu não tinha como mudar o que tinha acontecido comigo (e com eles). Mas eu tinha total escolha sobre quem eu queria ser e quem eu queria que eles fossem, a partir de então. E eu escolhi sermos pessoas felizes, mais unidos do que nunca, uma FAMÍLIA apesar de todos os pesares, com rigor nas coisas que formam o caráter, mas que se permite certas bobeiras "inofensivas" e deliciosas, como um sorvete ANTES do almoço ou comer no Mc três vezes, na mesma semana, porque tínhamos notas boas da escola a serem comemoradas.
Eu fui uma chata rigorosa? Fui. Muitas vezes.
Eu insisti, eu falei, eu repeti um milhão de vezes a mesma coisa? Sim.
Eu fui protetora (às vezes, até os protegi de pessoas muito próximas, deixando essas pessoas queridas chateadas)? Sim, eu fui.
Eu coloquei os sentimentos deles em relação ao pai (muito leves, por causa da pouca idade) acima dos meus sentimentos de esposa (muito profundos, pois eu já estava há quase 17 anos com o Fer) e/ou mulher? Diversas vezes.
Eu fui criticada quando permitia e quando proibia? Muitíssimo!
Eu acho que valeu a pena? Não. Eu tenho CERTEZA!
PS: pra vocês não acharem que eu sou sempre a "bruxa má", eu sou daquelas que beija, abraça, rola no chão pra brincar, faz cosquinha, inventa músicas, rele zilhões de vezes a mesma historinha, tá? Eu também tenho meu lado "mãe bacana"! ;)
Cenas do próximo capítulo aqui.
Hoje em dia é muito comum a gente ouvir isso: "deixa ele fazer tal coisa porque, tadinho, ele já não pode fazer aquilo...". Exemplos vem aos montes: o chefe dele é muito chato, então tudo bem se ele não fizer o serviço tão perfeito (ou se levar coisas do escritório pra casa ou se usar a máquina de xerox para coisas pessoais); a mulher dele (ou o marido dela) é insuportável (ou ciumenta, ou fechada, ou introvertida, ou está sempre tão cansada), então tudo bem se ele ficar bêbado toda sexta e sábado (ou se ele flertar com outras pessoas, ou se ele der mais importância aos amigos do que à família); o filho deles é tão difícil que tudo bem se...
No meu caso, a "lei da compensação" vinha, principalmente, na criação das crianças. "Miriane, você é muito rigorosa! Os coitadinhos já perderam o pai! Porque precisam levar uma bronca desse tamanho se baterem no amiguinho, na escola?..." ou "Miriane, quanto exagero! Os coitadinhos já perderam o pai, que problema tem eles derrubarem (e quebrarem) um aparelho na casa da vovó? Foi sem querer...."
Eu concordo: eles já tinham perdido o pai. Fato! Eram órfãos de pai aos 5 e 3 anos de idade. E, na minha concepção, isso JÁ fazia com que a infância deles fosse bastante diferente da infância do resto das crianças ao redor. Eles não precisavam ser diferentes em mais coisas! Eles não podiam não ter consciência (e consequência) dos atos deles, só porque eles já tinham sofrido algo involuntariamente. Não, eu queria que eles tivessem a infância mais normal possível! Então, eu tentava fazer com os dois e-xa-ta-men-te aquilo que (eu acho que) faria, caso o pai deles ainda estivesse aqui.
Era aceitável? Foi uma coisinha de nada, boba? Peça desculpas e caso encerrado. Foi sem querer? Peça desculpas, dê um jeito de restituir o que se quebrou e caso encerrado. Foi maldade? Peça desculpas e fique de castigo um pouco, pra conversarmos sobre a situação. Cada ação tinha sua reação, na medida e intensidade necessárias e condizentes com a SUA AÇÃO.
Porque a gente não tem que ser educado só quando tem os dois pais. A gente não tem que respeitar os outros só quando não é órfão. A gente não tem direito de fazer o que é inaceitável só porque a gente já "sofreu a nossa cota".
Eu queria que eles fossem crianças felizes, saudáveis, tranquilas, realizadas E obedientes, responsáveis, respeitosas, agradáveis "apesar de". Eu não tinha como apagar um fato da vidinha deles: o pai faleceu, num acidente, numa estrada. Ponto. Mas eu não queria que isso os DEFINISSE!
E tudo o que valia pra eles, valia pra mim! Ser viúva não era desculpa para o indesculpável, pro falar ríspido, pra me comprometer com algo e não cumprir, pra abandonar tudo (crianças inclusive) e ficar chorando num canto (apesar de que, de vez em quando, a vontade era mesmo de sumir...). Eu não tinha como mudar o que tinha acontecido comigo (e com eles). Mas eu tinha total escolha sobre quem eu queria ser e quem eu queria que eles fossem, a partir de então. E eu escolhi sermos pessoas felizes, mais unidos do que nunca, uma FAMÍLIA apesar de todos os pesares, com rigor nas coisas que formam o caráter, mas que se permite certas bobeiras "inofensivas" e deliciosas, como um sorvete ANTES do almoço ou comer no Mc três vezes, na mesma semana, porque tínhamos notas boas da escola a serem comemoradas.
Eu fui uma chata rigorosa? Fui. Muitas vezes.
Eu insisti, eu falei, eu repeti um milhão de vezes a mesma coisa? Sim.
Eu fui protetora (às vezes, até os protegi de pessoas muito próximas, deixando essas pessoas queridas chateadas)? Sim, eu fui.
Eu coloquei os sentimentos deles em relação ao pai (muito leves, por causa da pouca idade) acima dos meus sentimentos de esposa (muito profundos, pois eu já estava há quase 17 anos com o Fer) e/ou mulher? Diversas vezes.
Eu fui criticada quando permitia e quando proibia? Muitíssimo!
Eu acho que valeu a pena? Não. Eu tenho CERTEZA!
PS: pra vocês não acharem que eu sou sempre a "bruxa má", eu sou daquelas que beija, abraça, rola no chão pra brincar, faz cosquinha, inventa músicas, rele zilhões de vezes a mesma historinha, tá? Eu também tenho meu lado "mãe bacana"! ;)
Cenas do próximo capítulo aqui.
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terça-feira, 17 de julho de 2012
Festa das Princesas da Disney (Diário da Nina)
Se você recebeu aquele convite liiiiiiiiiiindo para o banquete real, você foi parar nessa festa aqui (que a gente ajudou a organizar!!! A-MA-MOS!!!).
Parece que tinha muita coisa, tudo lindo, a mesa mega cheia... mas na-na-ni-na-não! O truque, baby, é prestar atenção nos detalhes! A mãmi já descobriu isso faz tempo...
Na mesa do bolo, tinham docinhos espalhados por todos os lados, e algumas bonecas das princesas (você pode usar as da própria aniversariante! #ficaadica
Compre uma folha (inteira) de papel adesivo e cole quantas vezes você quiser, o arquivo abaixo. Dá pra fazer mil coisas com ele!!! Nós fizemos as bandeirinhas que foram nos doces e nos pates. E com a faixinha, nós fizemos a identificação das lembrancinhas!
As próprias lembrancinhas serviram pra enfeitar a mesa do bolo!!! Aos pés da Branca de Neve... uma pilha de maças, sem veneno, cheias de guloseimas pros gente pequena levar pra casa! EBA!!!!
Como a festinha foi na hora do almoço, a gente ia precisar de pratos e talheres, certo? Então... um toque bem simples (e barato! Um rolo inteiro de fita de TNT com dourado ficam em R$ 6,00! E dá pra tudo!) e cheio de efeito é amarrar os talheres com uma fitinha e centralizá-los nos pratos! Não ficou lindo??
As mesas foram arrumadas assim: toalhas brancas (já do local), uma faixa de TNT rosa no centro, um porta guardanapos de coroa (feito de EVA! Lindo, prático e barato! Obrigada tia E!!!), comidinhas.
Reparem que só fato de intercalar copos descartáveis coloridos e comprar guardanapos de uma cor contrastante, já faz todo o visual ficar festivo!
Reparou???? Mais um detalhe que fez tooooda a diferença foi a identificação das comidas! Na mesa principal, tinham essas plaquinhas. Nas mesas dos convidados, essas menores, pra ficar bonito. Copie o arquivo e cole num documento do word, imprima no formato "paisagem", dobre no meio e plim! Suas identificações de comidas estão prontas!!!
Depois das 3, uma aniversariante foi se transformar numa princesa... Coroa, vestido brilhante e pezinhos pequenos em sapatilhas prateadas... mãmi e seus detalhes!
E no "parabéns", muitas amigas pra ajudar a apagar as velinhas!!!
E foi isso: mais uma amiga ficando mais velha linda! Mais uma festa deliciosa! Mais uma vez, a mãmi dormindo tarde por uma ÓTIMA causa! Afinal... as pessoas não fazem três anos todo dia, né?
Interlúdio 5 - fórmulas pra se viver.... (Diário da Mirys)
Durante esse tempo todo de viuvez (mais de dois anos e meio depois dela, eu ainda não me acostumo com esse termo...), eu ouvi muita coisa, muita gente com "fórmulas prontas" para criação de filhos, para minha vida pessoal, para como lidar com todas as mudanças que estavam ocorrendo. Ouvi muitos "eu SEI o que você está sentindo...", "eu SEI o que você está passando...", "eu, no SEU lugar, faria tal coisa...", "você DEVE fazer isso ou não fazer aquilo porque é isso que DEVE ser feito nessas situações", "o MAIS RAZOÁVEL (ou, pior, "o CORRETO") a se fazer é...".
Mas, como saber o que é "razoável", numa situação que não tem nada de razoável??? Como usar a mesma "fórmula secreta" da felicidade e da postura em sociedade para todas as pessoas existentes no mundo, sendo que as vidas delas eram tãããão diferentes da minha? Como dizer o que alguém deve ou não fazer (realizar, desejar, sentir, querer) quando você não está vivendo a vida dela???
Pra alguns mais íntimos, com quem eu tinha mais liberdade, eu me dei ao direito de falar "não". Com todo o amor do mundo e um sorriso no rosto, eu disse: "não, você NÃO sabe o que eu estou sentindo ou passando. E não, você NÃO pode nem imaginar! E graças a Deus por isso, porque você NÃO tem que viver o que eu vivo". Algumas vezes, fui compreendida... outras vezes, não. E confesso que, até hoje, algumas pessoas ainda insistem em me dizer que eu "deveria" fazer certas coisas ou que eu deveria fazê-las de certo modo (diferente, obviamente, do que eu faço), mais normal, mais comum, mais aceito. Não as recrimino, não censuro, não me oponho... eu tento explicar a minha versão, mas só. Não espero que os outros entendam o que nem eu mesma consigo expressar... (como o fato de me sentir "casada", mesmo depois de mais de 2 anos do acidente que me deixou viúva).
Na minha visão, algumas coisas eram inabaláveis, sólidas, certas:
* eu tinha um Deus e eu Ele tinha (tem) um plano BOM pra minha vida. Melhor do que o meu. Eu creio assim.
* eu tinha (tenho) duas crianças para criar, que já tinham perdido o pai. Não seria justo, com eles, que perdessem a mãe, também, para a tristeza, para a desistência, para a auto-piedade.
* a vida é curta. É linda, é deliciosa, é complexa demais e é curta. Então, deixe claro HOJE praqueles que você se importa, que você se importa.
* não vou deixar de sentir o que eu tiver que sentir (seja felicidade ou tristeza) porque alguém me disse que ELE não faria assim. A vida é minha, o ônus e o bônus são meus! Estando dentro do que EU acho razoável, dentro da MINHA experiência de vida, se não estiver machucando ou ofendendo ninguém (filhos incluídos), eu VOU fazer.
* ninguém (a não ser que a pessoa tenha passado pela mesma experiência que eu, tão intensa, tão aterradora, tão devastadora, tão marcante) vai entender as loucuras de uma viuvez precoce.
Nada além...
PS: um dia, uma grande amiga, me ligou pra conversar um pouquinho e me contou um caso de uma moça, do prédio dela, que tinha passado pela mesma experiência do que eu. E, como sempre acontece, aqueles mais próximos a ela acabavam "julgando" as atitudes que ela tinha. Até que um dia, alguém veio comentar sobre uma atitude daquela viúva com a minha amiga. "Você não acha um absurdo???". A resposta foi brilhante: "Eu acho que o que ela passou foi insuportável, humanamente falando. A partir de agora, ela pode fazer o "absurdo" que ela quiser porque ela tem IMUNIDADE". A partir de então, sempre que eu me cobrava de alguma coisa, eu me lembrava: pra E., eu sou assim - imune! Porque a E. não precisou entender. Ela soube respeitar!
Cenas do próximo capítulo aqui.
Mas, como saber o que é "razoável", numa situação que não tem nada de razoável??? Como usar a mesma "fórmula secreta" da felicidade e da postura em sociedade para todas as pessoas existentes no mundo, sendo que as vidas delas eram tãããão diferentes da minha? Como dizer o que alguém deve ou não fazer (realizar, desejar, sentir, querer) quando você não está vivendo a vida dela???
Pra alguns mais íntimos, com quem eu tinha mais liberdade, eu me dei ao direito de falar "não". Com todo o amor do mundo e um sorriso no rosto, eu disse: "não, você NÃO sabe o que eu estou sentindo ou passando. E não, você NÃO pode nem imaginar! E graças a Deus por isso, porque você NÃO tem que viver o que eu vivo". Algumas vezes, fui compreendida... outras vezes, não. E confesso que, até hoje, algumas pessoas ainda insistem em me dizer que eu "deveria" fazer certas coisas ou que eu deveria fazê-las de certo modo (diferente, obviamente, do que eu faço), mais normal, mais comum, mais aceito. Não as recrimino, não censuro, não me oponho... eu tento explicar a minha versão, mas só. Não espero que os outros entendam o que nem eu mesma consigo expressar... (como o fato de me sentir "casada", mesmo depois de mais de 2 anos do acidente que me deixou viúva).
Na minha visão, algumas coisas eram inabaláveis, sólidas, certas:
* eu tinha um Deus e eu Ele tinha (tem) um plano BOM pra minha vida. Melhor do que o meu. Eu creio assim.
* eu tinha (tenho) duas crianças para criar, que já tinham perdido o pai. Não seria justo, com eles, que perdessem a mãe, também, para a tristeza, para a desistência, para a auto-piedade.
* a vida é curta. É linda, é deliciosa, é complexa demais e é curta. Então, deixe claro HOJE praqueles que você se importa, que você se importa.
* não vou deixar de sentir o que eu tiver que sentir (seja felicidade ou tristeza) porque alguém me disse que ELE não faria assim. A vida é minha, o ônus e o bônus são meus! Estando dentro do que EU acho razoável, dentro da MINHA experiência de vida, se não estiver machucando ou ofendendo ninguém (filhos incluídos), eu VOU fazer.
* ninguém (a não ser que a pessoa tenha passado pela mesma experiência que eu, tão intensa, tão aterradora, tão devastadora, tão marcante) vai entender as loucuras de uma viuvez precoce.
Nada além...
PS: um dia, uma grande amiga, me ligou pra conversar um pouquinho e me contou um caso de uma moça, do prédio dela, que tinha passado pela mesma experiência do que eu. E, como sempre acontece, aqueles mais próximos a ela acabavam "julgando" as atitudes que ela tinha. Até que um dia, alguém veio comentar sobre uma atitude daquela viúva com a minha amiga. "Você não acha um absurdo???". A resposta foi brilhante: "Eu acho que o que ela passou foi insuportável, humanamente falando. A partir de agora, ela pode fazer o "absurdo" que ela quiser porque ela tem IMUNIDADE". A partir de então, sempre que eu me cobrava de alguma coisa, eu me lembrava: pra E., eu sou assim - imune! Porque a E. não precisou entender. Ela soube respeitar!
Cenas do próximo capítulo aqui.
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segunda-feira, 16 de julho de 2012
Interlúdio 4 - o segundo ano (Diário da Mirys)
Apesar do choque pelo fato do primeiro ano NÃO TER TERMINADO COM UMA LINHA DE CHEGADA, que deixaria pra trás todo o meu sofrimento, eu toquei o barquinho e segui. Afinal, qual outra opção eu tinha???
Mas, fato é que, depois de um ano, você percebe que o pior, assim, daquele tipo insuportavelmente pior, já passou. Você sobreviveu. As crianças estão bem (suuuuper bem, graças a Deus), psicologica, emocional, mental e fisicamente (segundo vários profissionais de várias áreas diferentes). O resto da família vai muito bem, também. A vida seguiu, de forma suave e em paz, para um montão de gente que você ama (alguns casaram, outros tiveram filhos, outros realizaram sonhos). E eu estava genuinamente feliz por todos os outros! Comigo mesma eu não estava feliz: estava tranquila. Porque "ser feliz", de uma forma completa, era pedir demais pra mim mesma. Então, eu não pedia.
Ideia bárbara essa de dividir o tempo em pedaços (dias, meses e anos) porque você acaba dividindo a vida também. E acaba pensando que "aquela dor", aquele momento ruim, aquela confusão ficou em outro "pedaço". Ponto final! E isso já foi sentido logo no 1o mês do segundo ano.
Nada mais era novidade: eu já tinha passado por um Natal, um ano novo, uma páscoa, um dia dos pais, um dia dos namorados, um aniversário de casamento sozinha. Já tinha passado por um aniversário do Guigo, um da Helena, um meu e um dele, sozinha. Já tinha comparecido a um casamento, um nascimento, sem ele. Já tinha resolvido um problema do carro, um da casa, feito uma mudança (3, na verdade), iniciado um novo hobby, viajado pra longe e pra perto, frequentado uma nova igreja, sozinha.
Mas o grande "detalhe" é que eu não me SENTIA sozinha, no sentido de ser solteira, livre e solta, à procura de alguém. Eu pertencia ao Fer e ainda me sentia desleal se eu olhasse para o lado, eu ainda procurava a aliança na minha mão esquerda, eu ainda o chamava de "meu marido" e a mãe dele de "minha sogra" e o pai dele de "meu sogro", eu ainda fazia tudo igual antes. Só que SEM ELE. Único detalhe... sem ele... Então, eu percebi que o meu grande problema era que eu ainda me sentia CASADA. Assim: em letras garrafais, como eu tinha sido.
Era um problema do meu íntimo, eu sei... e que só eu podia resolver... e, durante muitos meses, eu não consegui. A ideia de olhar pra outra pessoa era inimaginável. Pra mim, internamente, era "traição". É incrível o que a morte faz com quem fica...
PS: por tudo isso, por ainda estar tão intenso, eu comecei a escrever a nossa história de "antes do acidente" - a saga Era Uma Vez...
Cenas do próximo capítulo aqui.
Mas, fato é que, depois de um ano, você percebe que o pior, assim, daquele tipo insuportavelmente pior, já passou. Você sobreviveu. As crianças estão bem (suuuuper bem, graças a Deus), psicologica, emocional, mental e fisicamente (segundo vários profissionais de várias áreas diferentes). O resto da família vai muito bem, também. A vida seguiu, de forma suave e em paz, para um montão de gente que você ama (alguns casaram, outros tiveram filhos, outros realizaram sonhos). E eu estava genuinamente feliz por todos os outros! Comigo mesma eu não estava feliz: estava tranquila. Porque "ser feliz", de uma forma completa, era pedir demais pra mim mesma. Então, eu não pedia.
Ideia bárbara essa de dividir o tempo em pedaços (dias, meses e anos) porque você acaba dividindo a vida também. E acaba pensando que "aquela dor", aquele momento ruim, aquela confusão ficou em outro "pedaço". Ponto final! E isso já foi sentido logo no 1o mês do segundo ano.
Nada mais era novidade: eu já tinha passado por um Natal, um ano novo, uma páscoa, um dia dos pais, um dia dos namorados, um aniversário de casamento sozinha. Já tinha passado por um aniversário do Guigo, um da Helena, um meu e um dele, sozinha. Já tinha comparecido a um casamento, um nascimento, sem ele. Já tinha resolvido um problema do carro, um da casa, feito uma mudança (3, na verdade), iniciado um novo hobby, viajado pra longe e pra perto, frequentado uma nova igreja, sozinha.
Mas o grande "detalhe" é que eu não me SENTIA sozinha, no sentido de ser solteira, livre e solta, à procura de alguém. Eu pertencia ao Fer e ainda me sentia desleal se eu olhasse para o lado, eu ainda procurava a aliança na minha mão esquerda, eu ainda o chamava de "meu marido" e a mãe dele de "minha sogra" e o pai dele de "meu sogro", eu ainda fazia tudo igual antes. Só que SEM ELE. Único detalhe... sem ele... Então, eu percebi que o meu grande problema era que eu ainda me sentia CASADA. Assim: em letras garrafais, como eu tinha sido.
Era um problema do meu íntimo, eu sei... e que só eu podia resolver... e, durante muitos meses, eu não consegui. A ideia de olhar pra outra pessoa era inimaginável. Pra mim, internamente, era "traição". É incrível o que a morte faz com quem fica...
PS: por tudo isso, por ainda estar tão intenso, eu comecei a escrever a nossa história de "antes do acidente" - a saga Era Uma Vez...
Cenas do próximo capítulo aqui.
sexta-feira, 13 de julho de 2012
Interlúdio 3 - os meses (Diário da Mirys)
Todo mundo dizia: "é só dar tempo ao tempo", "deixe o tempo passar", "o tempo faz milagres". Mas o fato é que o tempo já tem tempo demais e eu não precisava dar nada a ele! Os dias passaram, o conjunto deles se transformava em meses, e a dor não passava. A saudade não passava. A falta de ter alguém que te conheça DESSE TANTO pra dividir a vida com você não passava...
Enfim...
Se o primeiro mês foi meio "em stand by", meio anestesiada, meio "fora da realidade", os meses seguintes foram beeeeem difíceis. Conforme a ficha caia, o dia 23 ficava mais complicado de suportar.
No quarto mês, criei coragem, voltei na casa antiga e mexi nas coisas dele. Separei, organizei, doei, resolvi! No quinto mês, eu "inventei" o nosso "Dia da Família" e a campanha "Gaste tempo com quem você ama", como uma forma de homenagem à vida alheia e como uma forma de fuga da minha própria.
E quando eu achei que o pior já tinha passado, que eu já estava subindo do fundo do poço... veio a recaída! Porque eu fazia a minha parte: ficava forte, focava nas crianças, colocava um sorriso no rosto e seguia! Mas, a vida também fazia a parte dela... e me mandava letras de músicas e mais músicas, cheiros, pessoas, sonhos (poucos, ainda bem!), demonstrações de amor na minha frente... e ficava insuportável continuar, às vezes. No sexto mês, inesperadamente, eu me vi voltando ao fundo mais fundo do poço mais profundo, onde falta tudo, sem ver como eu sairia de lá.
Só que, agora, fazia mais tempo "sem ele". Então, bateu uma vontade aguçada de tentar voltar no tempo e chegar mais perto. E eu colocava as crianças pra dormir e ficava buscando e-mails antigos, bilhetes, cartas, recados, composições antigas. Qualquer coisa, QUALQUER COISA que trouxesse o Fer e aquela sensação boa de contar com alguém pra perto de mim, de novo...
Sorte que, na segunda queda, a recuperação é mais rápida! Até porque eu não sou de me entregar muito. Não sou de tristezas, reclamações e "mi-mi-mi". Até por isso demorei mais de 2 anos para escrever tudo isso. Porque, se escrevesse no dia dos acontecimentos, eu ia passar toda aquela dor pra vocês. E ninguém merece NEM IMAGINAR como aquilo foi! Então, eu voltei pra tentativa constante de levar uma vida boa e feliz e alto astral comigo mesma, e comecei a fazer piada de mim, de novo!
Mas, chegou dezembro e, com ele, a minha segunda data preferida no ano: o Natal. Seria o primeiro sozinha. E fazer de conta que eu estava bem, o ano todo, era uma coisa... mas fingir no Natal, quando o resto do mundo está genuinamente feliz??? Era doloroso demais! Mas eu tinha que continuar. Por mim. Pelas crianças. Pelas pessoas ao meu redor.
Por uma feliz "Deuscidência" da vida, quando o acidente completou um ano, eu não estava por perto de ninguém (além do Guigo e da Nina). Então, passei um dia tranquilo, chorei um pouco a noite, bebi um vinho bom, dancei sozinha pela sala de uma casa alugada, do outro lado do mundo, e esperei pela "grande virada". Sim! Porque terminar o primeiro ano de viuvez era uma proeza e eu tinha certeza de que, como num passe de mágica, o dia seguinte ao "aniversário" seria mais azul, mais ensolarado, mais musical, mais, mais, mais. Ledo engano...
Os dias se tornaram meses, de novo. E a vida seguia seu rumo, de novo. Só que, desta vez, todas as outras pessoas ao meu redor já tinham "superado" aquela dor. As mães continuaram a ser mães. Os maridos continuaram a ser maridos. Os filhos iam muito bem, obrigada. Tinham me alertado: depois de um tempo, a vida dos outros voltaria ao normal e ninguém ia mais ficar lembrando disso 24hs por dia. Eu sentia como se eu fosse a única a ter ficado pra trás, parada no tempo, esperando por uma vida que nunca mais iria voltar. Eu nunca mais seria a esposa dele. Mas eu ainda me sentia assim....
Cenas dos próximos capítulos aqui.
Enfim...
Se o primeiro mês foi meio "em stand by", meio anestesiada, meio "fora da realidade", os meses seguintes foram beeeeem difíceis. Conforme a ficha caia, o dia 23 ficava mais complicado de suportar.
No quarto mês, criei coragem, voltei na casa antiga e mexi nas coisas dele. Separei, organizei, doei, resolvi! No quinto mês, eu "inventei" o nosso "Dia da Família" e a campanha "Gaste tempo com quem você ama", como uma forma de homenagem à vida alheia e como uma forma de fuga da minha própria.
E quando eu achei que o pior já tinha passado, que eu já estava subindo do fundo do poço... veio a recaída! Porque eu fazia a minha parte: ficava forte, focava nas crianças, colocava um sorriso no rosto e seguia! Mas, a vida também fazia a parte dela... e me mandava letras de músicas e mais músicas, cheiros, pessoas, sonhos (poucos, ainda bem!), demonstrações de amor na minha frente... e ficava insuportável continuar, às vezes. No sexto mês, inesperadamente, eu me vi voltando ao fundo mais fundo do poço mais profundo, onde falta tudo, sem ver como eu sairia de lá.
Só que, agora, fazia mais tempo "sem ele". Então, bateu uma vontade aguçada de tentar voltar no tempo e chegar mais perto. E eu colocava as crianças pra dormir e ficava buscando e-mails antigos, bilhetes, cartas, recados, composições antigas. Qualquer coisa, QUALQUER COISA que trouxesse o Fer e aquela sensação boa de contar com alguém pra perto de mim, de novo...
Sorte que, na segunda queda, a recuperação é mais rápida! Até porque eu não sou de me entregar muito. Não sou de tristezas, reclamações e "mi-mi-mi". Até por isso demorei mais de 2 anos para escrever tudo isso. Porque, se escrevesse no dia dos acontecimentos, eu ia passar toda aquela dor pra vocês. E ninguém merece NEM IMAGINAR como aquilo foi! Então, eu voltei pra tentativa constante de levar uma vida boa e feliz e alto astral comigo mesma, e comecei a fazer piada de mim, de novo!
Mas, chegou dezembro e, com ele, a minha segunda data preferida no ano: o Natal. Seria o primeiro sozinha. E fazer de conta que eu estava bem, o ano todo, era uma coisa... mas fingir no Natal, quando o resto do mundo está genuinamente feliz??? Era doloroso demais! Mas eu tinha que continuar. Por mim. Pelas crianças. Pelas pessoas ao meu redor.
Por uma feliz "Deuscidência" da vida, quando o acidente completou um ano, eu não estava por perto de ninguém (além do Guigo e da Nina). Então, passei um dia tranquilo, chorei um pouco a noite, bebi um vinho bom, dancei sozinha pela sala de uma casa alugada, do outro lado do mundo, e esperei pela "grande virada". Sim! Porque terminar o primeiro ano de viuvez era uma proeza e eu tinha certeza de que, como num passe de mágica, o dia seguinte ao "aniversário" seria mais azul, mais ensolarado, mais musical, mais, mais, mais. Ledo engano...
Os dias se tornaram meses, de novo. E a vida seguia seu rumo, de novo. Só que, desta vez, todas as outras pessoas ao meu redor já tinham "superado" aquela dor. As mães continuaram a ser mães. Os maridos continuaram a ser maridos. Os filhos iam muito bem, obrigada. Tinham me alertado: depois de um tempo, a vida dos outros voltaria ao normal e ninguém ia mais ficar lembrando disso 24hs por dia. Eu sentia como se eu fosse a única a ter ficado pra trás, parada no tempo, esperando por uma vida que nunca mais iria voltar. Eu nunca mais seria a esposa dele. Mas eu ainda me sentia assim....
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quinta-feira, 12 de julho de 2012
Interlúdio 2 - sobre gavetas... (Diário da Mirys)
E lá estava eu: há um ano e meio de distância do dia mais difícil da minha vida. Eu tinha vivido conforme eu me propus, na manhã seguinte: um dia depois do outro. Devagarinho. Sem grandes planos. Pois eu não suportaria que qualquer outro plano fosse quebrado. Aquele, só aquele já era demais pra mim!
Eu ainda me lembrava, certinho, do meu "presente de aniversário" de 35 anos: aprovação no exame médico, do concurso público que eu tinha prestado três anos antes. O telegrama me chamando para o cargo tinha sido um presente de casamento (em outubro de 2009). A resposta médica, com aquela palavra "APTA", em letras garrafais, no papel da minha mão, era o meu presente de aniversário (em novembro de 2009). Lembro-me de ter respondido assim a vários torpedos que recebi naquele dia: "35 anos! Apta e FELIZ!!!"
Em dezembro, o Guigo se formou, na pré escola e, no dia seguinte, eu comecei a trabalhar em Ituverava. Eu estava realizada em todos os sentidos!!!
Se antes eu reclamava com o Fer que "a gente tinha tudo, só faltava ter um pouco menos de sufoco financeiro" (ai como era dura aquela vida de dois advogados autônomos, com duas crianças pequenas pra criar), agora, não faltava nada! O salário não era nada monstruoso, mas era CERTO. Vinha todo final de mês. Sem desesperos pras contas mais básicas fecharem. E, em dezembro de 2009, eu fiz o que sempre adorei fazer mas não podia mais, por longos anos: comprei um presentinho pra cada um da minha família (inclusive a do coração), no Natal!
Um mês depois, o acidente. Um mês depois, a mudança de status para viúva. Um mês depois, o baque. Um mês depois, ficava provado e óbvio pra mim que o mais importante não era ter o emprego, o salário, a tranquilidade que ele trazia, o filho formado na escola, os meus sonhos (materiais) que começavam a sair do papel. O mais importante eram as pessoas. E eu não tinha mais a pessoa que eu tinha escolhido pra mim, do meu lado...
Junto com o Fer, morreram meus planos de sermos (apenas) uma família de 4, de viajarmos pra lugares novos, de mostrarmos Paris pras crianças, de ensinarmos música e inglês no dia-a-dia, de envelhecer de mãos dadas. Junto com ele, uma parte de mim morreu, também...me deixando vazia, perdida, sozinha por longos meses...
E eu me agarrei com todas as forças às partes que tinham sobrado: a Miriane filha, a Miriane mãe (de duas crianças de 3 e 5 anos), a Miriane amiga dos outros, a Miriane nora, a Miriane neta. Eu escolhi que fosse assim. Que as minhas facetas que se relacionavam com outras pessoas ficassem. A profissional, a professora (mesmo que voluntária), a estudante, essas todas foram colocadas numa gavetinha, por um tempo, até que eu conseguisse pensar nelas, de novo.
E a Miriane mulher foi pra última gaveta do armário. Aquela que emperra pra abrir. Aquela que tem chave. Aquela inacessível. Aquela que você nem lembra que existe porque pouco usa... Não foi de propósito, foi automático. Instintivo, até. Mas, agora, já tinham se passado longos 18 meses... mais de 540 dias... mais de 540 noites sozinha... e a situação começou a me incomodar.
Só que gavetas emperradas são difíceis de abrir...
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Eu ainda me lembrava, certinho, do meu "presente de aniversário" de 35 anos: aprovação no exame médico, do concurso público que eu tinha prestado três anos antes. O telegrama me chamando para o cargo tinha sido um presente de casamento (em outubro de 2009). A resposta médica, com aquela palavra "APTA", em letras garrafais, no papel da minha mão, era o meu presente de aniversário (em novembro de 2009). Lembro-me de ter respondido assim a vários torpedos que recebi naquele dia: "35 anos! Apta e FELIZ!!!"
Em dezembro, o Guigo se formou, na pré escola e, no dia seguinte, eu comecei a trabalhar em Ituverava. Eu estava realizada em todos os sentidos!!!
Se antes eu reclamava com o Fer que "a gente tinha tudo, só faltava ter um pouco menos de sufoco financeiro" (ai como era dura aquela vida de dois advogados autônomos, com duas crianças pequenas pra criar), agora, não faltava nada! O salário não era nada monstruoso, mas era CERTO. Vinha todo final de mês. Sem desesperos pras contas mais básicas fecharem. E, em dezembro de 2009, eu fiz o que sempre adorei fazer mas não podia mais, por longos anos: comprei um presentinho pra cada um da minha família (inclusive a do coração), no Natal!
Um mês depois, o acidente. Um mês depois, a mudança de status para viúva. Um mês depois, o baque. Um mês depois, ficava provado e óbvio pra mim que o mais importante não era ter o emprego, o salário, a tranquilidade que ele trazia, o filho formado na escola, os meus sonhos (materiais) que começavam a sair do papel. O mais importante eram as pessoas. E eu não tinha mais a pessoa que eu tinha escolhido pra mim, do meu lado...
Junto com o Fer, morreram meus planos de sermos (apenas) uma família de 4, de viajarmos pra lugares novos, de mostrarmos Paris pras crianças, de ensinarmos música e inglês no dia-a-dia, de envelhecer de mãos dadas. Junto com ele, uma parte de mim morreu, também...me deixando vazia, perdida, sozinha por longos meses...
E eu me agarrei com todas as forças às partes que tinham sobrado: a Miriane filha, a Miriane mãe (de duas crianças de 3 e 5 anos), a Miriane amiga dos outros, a Miriane nora, a Miriane neta. Eu escolhi que fosse assim. Que as minhas facetas que se relacionavam com outras pessoas ficassem. A profissional, a professora (mesmo que voluntária), a estudante, essas todas foram colocadas numa gavetinha, por um tempo, até que eu conseguisse pensar nelas, de novo.
E a Miriane mulher foi pra última gaveta do armário. Aquela que emperra pra abrir. Aquela que tem chave. Aquela inacessível. Aquela que você nem lembra que existe porque pouco usa... Não foi de propósito, foi automático. Instintivo, até. Mas, agora, já tinham se passado longos 18 meses... mais de 540 dias... mais de 540 noites sozinha... e a situação começou a me incomodar.
Só que gavetas emperradas são difíceis de abrir...
Cenas dos próximos capítulos aqui.
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