quarta-feira, 18 de julho de 2012

Interlúdio 6 - lei da compensação (Diário da Mirys)

Eu não acredito na "lei da compensação" pra certas coisas. Mas eu nado contra a correnteza, eu sei...

Hoje em dia é muito comum a gente ouvir isso: "deixa ele fazer tal coisa porque, tadinho, ele já não pode fazer aquilo...". Exemplos vem aos montes: o chefe dele é muito chato, então tudo bem se ele não fizer o serviço tão perfeito (ou se levar coisas do escritório pra casa ou se usar a máquina de xerox para coisas pessoais); a mulher dele (ou o marido dela) é insuportável (ou ciumenta, ou fechada, ou introvertida, ou está sempre tão cansada), então tudo bem se ele ficar bêbado toda sexta e sábado (ou se ele flertar com outras pessoas, ou se ele der mais importância aos amigos do que à família); o filho deles é tão difícil que tudo bem se...

No meu caso, a "lei da compensação" vinha, principalmente, na criação das crianças. "Miriane, você é muito rigorosa! Os coitadinhos já perderam o pai! Porque precisam levar uma bronca desse tamanho se baterem no amiguinho, na escola?..." ou "Miriane, quanto exagero! Os coitadinhos já perderam o pai, que problema tem eles derrubarem (e quebrarem) um aparelho na casa da vovó? Foi sem querer...."

Eu concordo: eles já tinham perdido o pai. Fato! Eram órfãos de pai aos 5 e 3 anos de idade. E, na minha concepção, isso JÁ fazia com que a infância deles fosse bastante diferente da infância do resto das crianças ao redor. Eles não precisavam ser diferentes em mais coisas! Eles não podiam não ter consciência (e consequência) dos atos deles, só porque eles já tinham sofrido algo involuntariamente. Não, eu queria que eles tivessem a infância mais normal possível! Então, eu tentava fazer com os dois e-xa-ta-men-te aquilo que (eu acho que) faria, caso o pai deles ainda estivesse aqui.

Era aceitável? Foi uma coisinha de nada, boba? Peça desculpas e caso encerrado. Foi sem querer? Peça desculpas, dê um jeito de restituir o que se quebrou e caso encerrado. Foi maldade? Peça desculpas e fique de castigo um pouco, pra conversarmos sobre a situação. Cada ação tinha sua reação, na medida e intensidade necessárias e condizentes com a SUA AÇÃO.

Porque a gente não tem que ser educado só quando tem os dois pais. A gente não tem que respeitar os outros só quando não é órfão. A gente não tem direito de fazer o que é inaceitável só porque a gente já "sofreu a nossa cota".

Eu queria que eles fossem crianças felizes, saudáveis, tranquilas, realizadas E obedientes, responsáveis, respeitosas, agradáveis "apesar de". Eu não tinha como apagar um fato da vidinha deles: o pai faleceu, num acidente, numa estrada. Ponto. Mas eu não queria que isso os DEFINISSE!

E tudo o que valia pra eles, valia pra mim! Ser viúva não era desculpa para o indesculpável, pro falar ríspido, pra me comprometer com algo e não cumprir, pra abandonar tudo (crianças inclusive) e ficar chorando num canto (apesar de que, de vez em quando, a vontade era mesmo de sumir...). Eu não tinha como mudar o que tinha acontecido comigo (e com eles). Mas eu tinha total escolha sobre quem eu queria ser e quem eu queria que eles fossem, a partir de então. E eu escolhi sermos pessoas felizes, mais unidos do que nunca, uma FAMÍLIA apesar de todos os pesares, com rigor nas coisas que formam o caráter, mas que se permite certas bobeiras "inofensivas" e deliciosas, como um sorvete ANTES do almoço ou comer no Mc três vezes, na mesma semana, porque tínhamos notas boas da escola a serem comemoradas.

Eu fui uma chata rigorosa? Fui. Muitas vezes.
Eu insisti, eu falei, eu repeti um milhão de vezes a mesma coisa? Sim.
Eu fui protetora (às vezes, até os protegi de pessoas muito próximas, deixando essas pessoas queridas chateadas)? Sim, eu fui.
Eu coloquei os sentimentos deles em relação ao pai (muito leves, por causa da pouca idade) acima dos meus sentimentos de esposa (muito profundos, pois eu já estava há quase 17 anos com o Fer) e/ou mulher? Diversas vezes.
Eu fui criticada quando permitia e quando proibia? Muitíssimo!

Eu acho que valeu a pena? Não. Eu tenho CERTEZA!


PS: pra vocês não acharem que eu sou sempre a "bruxa má", eu sou daquelas que beija, abraça, rola no chão pra brincar, faz cosquinha, inventa músicas, rele zilhões de vezes a mesma historinha, tá? Eu também tenho meu lado "mãe bacana"! ;)

Cenas do próximo capítulo aqui.

6 comentários:

Carina Ferro disse...

Mirys,

Parabéns pela sua lucidez!!
Tem coisas que não dá pra compensar.


Beijos

Unknown disse...

Com certeza É uma mão muiiito bacana!!
Bjos
Ana

Anônimo disse...

Miriane, concordo plenamente com tudo o que escreveu!
Parabéns por ser assim, se a maioria das pessoas pensassem como você, nosso mundo estaria beeem melhor!
beijos
Sheila

Ilmara disse...

Nossa responsabilidade nao diminui 'apesar de' todas as coisas que acontecem... nao tenho duvidas da super mae que vc e'. Que Deus continue te dando sabedoria pra cumprir essa marabilhosa missao. Bjo. :-)

Claudia disse...

Parabéns pela sua atitude.
Eu confesso que não tenho sido tão rigorosa com a minha filha pq fico pensando "ela perdeu o pai".... mas claro que não tenho a menor paciência com birra, desobediência, choro sem motivo...

Roberta Bessa disse...

Olá Miriane.
Meu nome é Roberta. Sou uma das suas leitoras "ocultas", aquelas q vem se deliciar com tanta coisa legal que voce escreve, mas que dificilmente deixa uma mensagem...
Nao me lembro como conheci o seu blog. Acho q foi pelo blog do Woltony ( ele e a esposa eram amigos da minha irma). Bom, tenho uma amiga nos EUA que perdeu o marido com câncer. Ela ficou sozinha com 3 crianças ( 1 deles tinha 1 mês quando o pai faleceu). Eu queria muito poder ajuda-lá mas por estar distante era mais difícil. Então recomendei que ela viesse conhecer seu blog, pois acredito que a maneira como voce lida com as situações no seu dia a dia tb possam ajuda-lá a lidar com as dela. Hoje ela me contou que uma esposa de um pastor Orlando tb indicou o seu blog para ela ler, e que esse pastor é um primo seu ( nao sei o nome dele). Legal isso. Para falar a verdade, voce tb esta me ajudando muito a lidar com situações na minha vida e com meu filhos. Muito obrigada e que Deus abençoe muito voce, seus filhos e seus planos! Grande beijo!