sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Dia 23 (Diário da Mirys)

Anteontem, foi um dia 23. Foi o décimo terceiro desde o acidente que mudou a minha vida. Mas, também, foi o primeiro do novo ano.

Um ciclo (um ano) se fechou. Inicia-se outro. Pode parecer só uma questão de números, de calendário ou do que for. Mas, nós estamos condicionados a dividirmos nosso tempo assim: em dias, meses e anos. E te digo que concordo com Drummond (como poderia não concordar?): quem inventou esse negócio de fracionar o tempo foi brilhante! Mesmo!

Porque funciona. Querendo ou não, na sua cabecinha você considera que a etapa mais difícil dessa jornada já ficou pra trás. É claro que nada desapareceu, nem eu voltei no tempo e impedi o que não seria impedido por ninguém. Mas, é como se, oficialmente, a gente virasse a página. Está começando de novo, mas é o SEGUNDO ano. Falando assim, parece que fica tão distante...

Porque ajuda. Às vezes, sem perceber, quem passa por uma perda como a minha, pensa: porque, da última vez em que eu fiz isso, o Fer estava aqui. Ou comigo. Ou eu liguei para ele e ele falou tal coisa. Agora, não dá mais para pensar assim. Porque praticamente tudo o que eu tinha feito da “última vez” já virou “penúltima”. Ele estava no penúltimo aniversário das crianças, no penúltimo Natal, na penúltima vez de pagar o seguro do carro, na penúltima discussão sobre em qual curso extra matricular os pequenos. Como brasileiro (na verdade, acho que o mundo todo!) tem memória fraca, eu já penso “na última vez em que fiz isso, fiz sozinha. E deu certo, graças a Deus!”. E isso ajuda...

Porque alivia. No começo, a saudade é muito a flor da pele, a ausência é presente 100% do tempo, o cheiro está lá, nas roupas penduradas atrás da porta do quarto. Agora, eu uso as blusas dele (poucas que ficaram porque especiais) para fazer coisas do dia-a-dia e não sinto mais um peso. Sinto uma sensação boa de algo que o representa estar lá, comigo, naquele momento. Porque ele não pode estar e não é culpa, nem escolha minha. Nem de ninguém. Mas, um ano depois, ter algo dele comigo é bem mais leve...

Porque organiza. Quando você recebe uma notícia dessas, completamente inesperada, alguém tira o chão debaixo de você e você começa sua queda em direção ao fundo, muito fundo abismo do “nada”. Junto com você, caem as suas contas para pagar, crianças para criar, casa para gerenciar, carro para manter, planos para realizar, tranferências, inventário, registros, documentos e burocracias mil do nosso cotidiano. E você, simplesmente, não sabe por onde começar! É simples dizer “comece pelas crianças”. É simples. Difícil é fazer e ver tudo com clareza, no 1º ano. No segundo, você já está PhD em dar nós na vida, em estabelecer prioridades, em decidir onde o dinheiro será gasto ou aplicado. E começar, de novo, fevereiro, março, abril, depois de já ter feito uma vez o percurso em todos esses meses, você sabe exatamente como se organizar para passar por cada um deles.

Porque cria a ilusão do novo. Eu sei que são os mesmos dias de todos os outros anos da minha vida. Eu sei que os eventos (aniversários, páscoa, feriados, etc) vão se repetir. Mas dá uma sensação de folha em branco! Como se eu nunca tivesse feito nada, vivido nada, e pudesse começar aqui, agora, do zero. E melhor: com a experiência que eu já tenho de como a vida pode ser linda ou trágica, às vezes. Já estive nos dois extremos dessa história. Mas, ter a sensação de que se pode começar de novo, que você ganhou esse presente, é bom demais.

Então, vamoquevamo que o tempo não para e eu tenho mais umas páginas dessa vida para escrever. Espero que muitas! Espero que mais simples. Espero que mais leves. Espero que felizes (porque “mais felizes” seria pedir demais...).

5 comentários:

Dayane Cavalcante disse...

Te admiro muitoooo, muito mesmo!!Bjim!!

Anônimo disse...

AMIGA VC É ESPETACULAR....E QUE ESCRITORA, HEIN?
TEXTO IRRETOCÁVEL...SAUDADES SEMPRE
PAT

Anônimo disse...

Há uma frase do livro perdas e danos que diz o seguinte: "as pessoas sofridas são perigosas, pq sabem que sobrevivem".
Parabéns, vc sobreviveu.
E aos demais cuidado, pq vc agora é perigosa. Será preciso acontecer uma tragédia de tamanho estratosférico para tirar vc do eixo novamente...
Seja feliz!
Bjs.
Cinthya

Mirys Segalla disse...

Meninas:

MUITO OBRIGADA por estarem por aqui. Sempre!

Obrigada pelos comentários que dão toques, que despertam, que aquecem o coração, que ligam um botãozinho de "on" que eu teimo em deixar desligado.

Obrigada por me reconectar com o mundo e por me fazer sentir viva, só de ler a parte da minha vida que está na tela do computador...

Bjos e bençãos.
Mirys

Mirys Segalla disse...

Meninas:

MUITO OBRIGADA por estarem por aqui. Sempre!

Obrigada pelos comentários que dão toques, que despertam, que aquecem o coração, que ligam um botãozinho de "on" que eu teimo em deixar desligado.

Obrigada por me reconectar com o mundo e por me fazer sentir viva, só de ler a parte da minha vida que está na tela do computador...

Bjos e bençãos.
Mirys